Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O padre Mário de Sousa defendeu – na VIII Jornada Bíblica da Diocese do Algarve que decorreu no passado sábado no seu Centro Pastoral e Social em Ferragudo com a presença de 67 participantes – a criação de “equipas evangelizadoras” nas paróquias “que, a partir dos grandes centros evangelizem as comunidades circundantes”.

“Parece-me importante criar um pequeno grupo de cristãos com a potência e qualidades de liderança e de vida evangélica que se torna um grupo impulsionador da evangelização a partir da paróquia, que possa ser moderador de outros grupos e de equipas de evangelização ou de apoio a outras comunidades”, afirmou o sacerdote, lembrando ser assim que funcionava a “comunidade primitiva” e que “há muito a aprender com as equipas missionárias que caraterizam a primeira evangelização” e com a “metodologia das origens”.

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A Jornada Bíblica voltou a ser este ano promovida pela Igreja algarvia, através do Centro de Estudos e Formação de Leigos do Algarve (CEFLA), e teve como tema “A missão evangelizadora na Igreja das origens”.

Defendendo ser “preciso privilegiar os pequenos grupos, fazendo da paróquia uma comunidade de comunidades”, o formador, que é simultaneamente o diretor do CEFLA, considerou que “o tempo da paróquia a girar à volta de um único evangelizador – o pároco –, acabou”. “E, se calhar, graças a Deus”, completou. “Ou temos a coragem de rever os nossos processos evangelizadores e até a presidência das comunidades, ou teremos comunidades acéfalas, sem dinamismo interno quanto mais evangelizador. E isto, já. Não é para o século que vem”, prosseguiu no âmbito da intervenção que começou sobre o tema «”Vós sois testemunhas destas coisas” (Lc 24,48): A primeira evangelização – natureza é caraterísticas» e prosseguiu sobre a temática «”Que havemos de fazer, irmãos?” (At 2,37) A pergunta que redimensiona a vida».

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O sacerdote disse ser preciso “fazer discernimento de carismas, procurar líderes cheios da presença de Deus, gente disposta a anunciar o evangelho como vida”, acrescentando que “a evangelização implica a preparação” e que “primeiro é preciso a preparação dos de dentro para depois se poder anunciar aos de fora”. “É preciso que haja formadores de evangelizadores que dediquem tempo a essa formação e preparação”, completou, lembrando que “a evangelização não se trata apenas da transmissão fiel do mistério de Jesus, mas de uma experiência pessoal, de um testemunho”, ou seja, passa por “narrar a experiência de salvação” pessoal. “Não se pode ser discípulo sem ser evangelizador, porque só é verdadeiramente discípulo quem recebeu Jesus na sua vida. Neste sentido, evangelizar é uma consequência de quem se sente amado e salvo”, sustentou, lembrando também que “ninguém pode ser discípulo sozinho” e que “a conversão matura-se, vive-se, progride-se em comunidade”.

O padre Mário de Sousa disse ser igualmente necessário “mudar as estruturas” porque estas “têm que estar ao serviço da evangelização”. “As estruturas surgem e desaparecem, conforme as necessidades da missão evangelizadora da Igreja”, observou, considerando também que “os ministérios surgem para responder a necessidades”. “São as necessidades e a prática da comunidade que levam à criação do serviço”, sustentou, acrescentando que “não existe no novo testamento distinção entre serviço e ministério”, que “não se pode exercer um ministério sem uma pertença séria à Igreja” e que “os ministérios exercem-se em grupo e não a título individual”. Neste sentido destacou a “compreensão da missão como um serviço e não como um poder” e lamentou conceções carreiristas.

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O sacerdote considerou ainda que “a comunicação da Igreja de hoje vive de imagens e de um código linguístico que vem do passado”. “É necessário usar as técnicas de comunicação do nosso tempo”, acrescentou, considerando que a “linguagem é a grande questão da evangelização”. “É preciso rever a linguagem da catequese, da liturgia, do acolhimento”, propôs, apelando à “coragem de parar” nos “projetos diários e até pastorais, de forma a permitir o encontro”.

“Nós, muitas vezes, partimos para o diálogo evangelizador respondendo a perguntas que ninguém nos fez, as quais achamos que é importante dizer. É preciso partir das expectativas das pessoas e dos seus anseios e o grande anseio do mundo dos nossos dias é encontrar um sentido para a vida que conduza a uma vida feliz”, advertiu, explicando que esta “não é uma vida sem problemas”, mas “uma vida com sentido”.

Por outro lado, o formador alertou que evangelizar não consiste em “transmitir um conjunto de princípios morais ou mesmo impô-los aos outros”. “Há muitos movimentos hoje com grandes graças que Deus concede, mas que acentuam tanto a dimensão moral que desvirtuam o evangelho, apresentando-o como um código de conduta”, lamentou, sublinhando que “a moral é uma consequência da adesão a Jesus e não um caminho para Ele”. “Evangelizar não é querer impor uma moral aos outros que, por não serem cristãos, não entendem a razão de determinados valores que defendemos”, complementou, recordando que “a adesão a Jesus é um processo, um caminho que tem vários passos, que começa numa primeira decisão generosa e que termina com a necessidade de O anunciar”.

Neste sentido, o orador aconselhou a “procurar o essencial e o ponto de comunhão e, a partir daí, alavancar” e considerou ainda que “hoje, uma das grandes dificuldades do anúncio do evangelho é a mentalidade culturalmente fossilizada de que o batismo é um sacramento de adesão, quando o que o Senhor quer é conversão”. “O batismo surge como consequência desta decisão primeira que vai sendo purificada e renovada”, evidenciou, assegurando que “o importante nesta primeira fase é a decisão de dar início ao caminho”.

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O padre Mário de Sousa aludiu ainda à importância de atualizar a palavra de Deus. “Atualizar não significa modificar, mas descobrir a verdade de Deus para este momento concreto da história e tomar as decisões necessárias para ser fiel a essa vontade, mesmo que isso crie desinstalação e quase sempre crises”, sustentou, acrescentando que “um critério importante na evangelização” é “saber distinguir entre o que é essencial e o que é secundário”, uma vez que o que “verdadeiramente importa” “é a chegada de Jesus à vida das pessoas”. “Foi sobretudo aquilo que Jesus realizou, mormente o mistério da sua morte e ressurreição, que constitui o conteúdo principal daquilo que é preciso testemunhar”, realçou, lembrando ter sido “a ressurreição e a força que brota do túmulo em que a vida vence a morte” que transformou os discípulos. “É este anúncio que converte o grupo numa comunidade missionária”, destacou.

Primeira conferência (som disponível apenas a partir do minuto 17):

Segunda conferência: