
O diácono Luís Galante explica que “o Papa pretende que o cuidado com a natureza se torne ele próprio um caminho para combater a pobreza e as exclusões, sem prescindir do humanismo”.
“A penúria extrema, vivida nalguns ambientes privados de harmonia, magnanimidade e possibilidade de integração, facilita o aparecimento de comportamentos desumanos e a manipulação das pessoas por organizações criminosas. Para os habitantes de bairros periféricos muito precários, a experiência diária de passar da superlotação ao anonimato social, que se vive nas grandes cidades, pode provocar uma sensação de desenraizamento que favorece comportamentos anti-sociais e violência”, advertiu, citando Francisco na sua recente encíclica sobre o tema da ecologia, intitulada ‘Laudato si‘.
No encontro de apresentação no Algarve do documento, que teve lugar na última quarta-feira no Seminário de Faro, o diácono defendeu mesmo que este “fenómeno de desenraizamento urbano”, “em boa parte, explica a partida de jovens europeus para as zonas ocupadas pelo chamado Estado Islâmico”. “Esses jovens perdidos e marginalizados na Europa, atirados para a periferia suburbana da desocupação, desintegrados das suas raízes e dos bairros que não os acolhem devidamente, encontram na ilusão da aventura a identidade perdida e o projeto de realização pessoal”, considerou.

Advertindo que não se deve “deixar de prestar atenção aos avisos proféticos dos papas, mesmo em matéria financeira”, o diácono Luís Galante, recordou que “muitos minimizaram, nomeadamente nos Estados Unidos, mas não só, os receios manifestados por João Paulo II de que a invasão do Iraque pudesse causar uma guerra de civilizações”. “Pois é isso mesmo com que estamos agora confrontados no Médio Oriente. E tudo isto poderia ter sido evitado se os políticos tivessem prestado mais atenção à sabedoria profética e milenar da Igreja”, acrescentou.
O orador sublinhou ainda que para Francisco não há “crises separadas” – uma ambiental, outra social, outra económica ou financeira, outra familiar –, mas uma “crise geral”, “uma única e complexa crise” que o Papa designa de “sócio-ambiental”. “Depois de relembrar que a economia humana é inseparável da noção de bem comum – princípio que desempenha um papel central e unificador na ética social –, o Papa adverte que, nas condições atuais da sociedade mundial – onde há tantas desigualdades e são cada vez mais numerosas as pessoas descartas, privadas dos direitos humanos fundamentais –, o princípio do bem comum torna-se imediatamente um apelo à solidariedade e uma opção preferencial pelos mais pobres”, afirmou, lembrando que “esta opção implica tirar as consequências do destino comum dos bens da terra”.

O diácono considerou ainda que “esta ideia de destino comum dos bens da terra e as, cada vez mais, numerosas pessoas descartas, privadas dos direitos humanos mais elementares, traz à coação (e por que não também ao coração) os refugiados do Magrebe e do Médio Oriente que demandam a Europa através do Mediterrâneo que de Mare Nostrum se vem transformando em Mare Mortem”. “Os recentes episódios das fronteiras fechadas de França e das resistências de alguns países como o Reino Unido em aceitarem uma distribuição de quotas de refugiados, mostra como, infelizmente, a União Europeia se comporta”, criticou, considerando que “salva a honra da Europa, o acolhimento proporcionado pela Itália, certamente influenciada pelas frequentes intervenções do Papa Francisco, especialmente pela sua impressiva visita a Lampedusa”.
O diácono lembrou ainda que “este não é o primeiro documento em que a Igreja se debruça de verdade sobre o ambiente”. “Este é o primeiro que o faz de forma concentrada e principal”, precisou, considerando que a larga citação de Francisco do Patriarca de Constantinopla constitui um “reconhecimento de que fora da Igreja Católica, noutras Igrejas cristãs e até em outras religiões, têm sido dados válidos contributos sobre estes temas”. “A concreta citação do primaz da comunhão ortodoxa, representa não só um ecumenismo ecológico, mas principalmente uma ecologia religiosa que mostra que é através do diálogo ecuménico inter-religioso que se alcançará a cooperação das diferentes religiões”, acrescentou o diácono que apresentou os capítulos IV e V do documento.

A sessão contou ainda com as intervenções do bispo do Algarve, que fez a apresentação geral da encíclica e uma referência sumária aos seus capítulos I, II e III e do frei Paulo Ferreira que aludiu ao capítulo VI.
O A encíclica é o grau máximo das cartas que um Papa escreve. A expressão ‘Laudato si’, em italiano antigo, remete para o ‘Cântico das Criaturas’ (1225), de São Francisco de Assis, o religioso que inspirou o Papa argentino na escolha do seu nome, após a eleição pontifícia.