Nos últimos tempos, assistimos a dois casos de suposta espionagem dignos de um qualquer filme sobre a Guerra Fria na década de 80/90.

Para quem está atento à atualidade nacional e internacional é fácil depreender a que me refiro.

Falo, como será óbvio, do caso das escutas ilegais onde está incluindo o nosso sempre “simpático” e falador ministro Miguel Relvas bem como o antigo diretor do Serviço de Informações Estratégicas de Defesa (SIED) Jorge Silva Carvalho.

Também não poderia deixar de fora o caso Vatileaks, que entre outros factos, levou Paolo Gabriele, mordomo do Santo Padre desde 2006, à prisão já que supostamente será o responsável pelo furto de correspondência privada de Bento XVI que, posteriormente, tornou publica.

Para além das diferentes características e dos diversos aspetos circunstanciais que envolvem os dois casos, eles são semelhantes num único aspeto: a culpa da fuga de informação caiu, mais uma vez, sobre os jornalistas e comunicação social.

É interessante verificar que frequentemente quando surgem acontecimentos e factos que levantam algum tipo de escândalo público, os seus protagonistas são incapazes de assumir as suas responsabilidades e tentam escamotear a situação. Ora, tal faz da comunicação social e dos seus profissionais o bode expiatório de toda a situação, desviando, assim, a atenção da opinião pública para uma responsabilidade específica e intrínseca das instituições visadas, que as deveria levar a pensar e refletir.

Como guias para essa reflexão, apenas gostaria de deixar duas questões:

1. No caso nacional: será que a responsabilidade pela produção das afirmações contraditórias por parte do Sr. Ministro Miguel Relvas procedeu de algum vício dos jornalistas e da comunicação social?

2. No caso internacional: será que a alegada culpa da apresentação do mordomo do Santo Padre como “testa de ferro” de uma suposta rede de influência é culpa da Comunicação Social?

Não foram os jornalistas que prenderam o mordomo de Bento XVI, nem tinham anteriormente demitido, de forma abrupta, o presidente do banco do Vaticano (Instituto para as Obras da Religião, IOR), Ettore Gotti Tedeschi, quando este tentava tornar o IOR mais transparente, para que um grupo de peritos do Conselho da Europa decidisse, nas semanas seguintes, que a Santa Sé não tem entidades que pactuam com a lavagem de dinheiro. Colocar as responsabilidades nos media visa, em muito casos, não só não assumir as verdadeiras responsabilidades de quem causa determinadas situações, como “tapar o sol com a peneira”. A comunicação social não pode servir apenas para quando nos interessa promovermo-nos e promover o que realizamos; a comunicação social tem, também, uma importante função de denúncia e de esclarecimento da opinião pública, que não pode – nem deve ser – descurada e esquecida, função essa que se encontra plasmada na Constituição da República, Lei de Imprensa e Código Deontológico dos Jornalistas. Para o bem e para o mal, ser jornalista implica uma profunda e comprometida identificação com o um ideal de verdade e de serviço público, que, curiosamente, creio igualmente ser indesmentível estar presente no Evangelho: “Conhecereis a Verdade e a Verdade vos libertará”(Jo 8, 32). E apetece-me terminar com uma expressão popular, pois o povo, na sua ingénua sabedoria, acaba por definir muitas regras de conduta e muitas verdades indesmentíveis: “Gato escondido com rabo de fora” regra geral é apanhado, que é o mesmo que dizer, “não há nada oculto, que não se venha a descobrir”.

Miguel Neto