© Samuel Mendonça
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Luís Portela lamentou que a humanidade, não obstante todo o “desenvolvimento científico e tecnológico”, tenha deixado “para trás” no século XX a “área da espiritualidade”.

“Acho quase incompreensível que isto tenha acontecido”, afirmou o médico e ex-docente de Psicofisiologia da Universidade do Porto no colóquio sobre espiritualidade promovido na última segunda-feira no auditório do hospital de Faro pelo núcleo do Algarve da Associação de Médicos Católicos Portugueses, subordinado ao tema “Abordagem Científica e Religiosa – A cultura europeia. Que espiritualidade?”.

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“Tão focados no desenvolvimento material e na matéria, estamos a viver demasiadamente apegados à matéria e estamos a deixar para trás aquilo que são os grandes valores universais da humanidade que hoje estão como que esquecidos”, lamentou, considerando que “a ciência deveria agora, no século XXI, focar-se mais no esclarecimento das coisas de ordem espiritual”.

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Como exemplo, Portela aludiu a uma investigação, promovida pelo diretor do departamento de psiquiatria da Universidade de Virgínia (EUA), sobre “vidas passadas” de cerca de 3000 crianças até aos seis anos “de todo o mundo”, para defender que estes alegados fenómenos devem ser estudados. “Acho que estão aqui elementos que merecem ser estudados e tornam obrigatório a investigação científica destes casos para que a humanidade, definitivamente, se esclareça. Caberá à ciência investigar e esclarecer. Parece-me que essa será uma maneira de investigarmos o que somos espiritualmente”, defendeu, afirmando-se “convencido que alguns dos fenómenos apontados são disparates”.

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O orador esclareceu não ser “religioso”, no sentido de “aderir” a alguma religião, apesar de considerar Jesus “o Mestre dos mestres” no qual se revê nos “momentos mais difíceis”. “Para mim, as religiões são caminhos possíveis que eu respeito muito, muito úteis à humanidade ao longo da sua história. As diferentes religiões indicam-nos caminhos apropriados a nos encontrarmos connosco próprios e com o todo. Se as religiões se colocarem no essencial das perspetivas dos mestres, abdicando daquilo que é secundário, se calhar vão-se unir e encontrar na verdade total”, sustentou, classificando-se como “um espiritualista”. “Na minha perspetiva, eu, Luís Portela, não sou este corpo que está aqui. Eu sou a energia que anima este corpo que está aqui durante umas décadas”, complementou, considerando-se uma “partícula de energia” como aquela que defende existir nos animais, nas plantas e nos minerais.

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No colóquio em que participaram perto de 200 pessoas, transmitido em sistema de videoconferência para o Hospital do Barlavento, em Portimão, o cónego Carlos César Chantre, segundo orador da tarde, também reconheceu a importância da investigação. “Todas as vezes que alguém da Igreja ou fora dela perturbou a investigação para a verdade, desviou-se das orientações da Igreja”, advertiu.

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No entanto, lembrou que “a ciência é para servir a verdade do homem em todo o seu esplendor, de uma tendência espiritual, de outra tendência espiritual ou de tendência de coisa nenhuma”, lamentando que o século XVIII tenha eternizado a “deusa razão” quando a ciência “pensou que Deus fosse uma construção da mente, incapaz de resistir ao conhecimento científico”.

O sacerdote lembrou que “uma das caraterísticas da cultura oriental é o silêncio para descobrir os fundamentos do espírito”. “Um dos problemas graves do mundo em que vivemos, naquilo a que chamamos – não sei se propriamente, se impropriamente – a civilização ocidental, é a ausência de silêncio para se contemplar a beleza”, destacou, considerando que “a questão da espiritualidade, partindo de Jesus Cristo, vai entroncar com o princípio da beleza”. “Eu faço parte da beleza, tu fazes parte da beleza, mas eu só sou a beleza se tu fores beleza”, acrescentou.

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Assumindo “pontos em desacordo” com Luís Portela, o cónego César Chantre rejeitou a possibilidade de “vidas sucessivas” que aquele profissional da saúde não descarta. “Deus, ao assumir a humanidade em Jesus Cristo, está a assumir toda a espécie humana. Toda a espécie humana é solidária. É por isso que nada acontece a um [ser humano] que não aconteça a outro [ser humano], em complementaridade. É uma questão solidária entre si porque sem esta complementaridade da espécie [humana], a espécie deixa de o ser”, referiu.

Por outro lado, discordou também do conceito de “partícula de energia”. “Partícula pode levar a compartimentos e a pessoa, em si mesma, é a totalidade da espécie. E o todo universal é, inequivocamente, o Criador, Deus, que se expressou em Jesus Cristo, respeitando todos os outros caminhos que tentem chegar a esse mesmo Criador”, concluiu.