O padre Daniel Nascimento explicou ao clero das dioceses do sul de Portugal que “o Jubileu constitui uma crítica, não só à acumulação privada massiva de terras e riquezas relacionadas, mas também de formas, em larga escala, de coletivismo ou nacionalização que destroem qualquer sentido significativo de propriedade pessoal ou familiar”.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O sacerdote da Diocese de Setúbal, que é professor de Sagrada Escritura na Universidade Católica Portuguesa e que esta tarde refletiu na atualização anual de bispos, padres e diáconos das dioceses de Algarve, Beja, Évora e Setúbal sobre o tema “O Jubileu na Sagrada Escritura. Atualização e aplicação aos nossos tempos”, considerou que o Ano Santo “não obstante a impossibilidade de uma aplicação literal das suas disposições”, “continua a ser um modelo poderoso de formulação da ética bíblica cristã”. 

“As suas principais premissas e objetivos podem ser utilizados como um guia crítico para a nossa própria agenda ética na era moderna”, referiu. 

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O sacerdote, que se deteve na análise da raiz bíblica do Jubileu, explicou que do ponto de vista social, este “representava uma preocupação prática com a unidade familiar”. “No caso de Israel, isto significava a família alargada, a casa do Pai que era um grupo considerável de famílias nucleares aparentadas incluído até três ou quatro gerações”, acrescentou, explicando também que o Jubileu visava “restaurar a dignidade social das famílias através da manutenção ou restauração da sua viabilidade económica”. “O colapso económico de uma família numa geração não deveria condenar todas as gerações futuras à escravidão do endividamento perpétuo”, referiu. 

O especialista em Sagrada Escritura explicou que, “tal como o resto das disposições sabáticas, o Jubileu proclamava a soberania de Deus sobre o tempo e a natureza” e que “o cumprimento dessas normas exige uma submissão a essa soberania”.

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O padre Daniel Nascimento acrescentou que à dimensão histórica se acrescentou a “experiência cultual do perdão, pelo facto de o Jubileu ter sido proclamado no dia da expiação”. “Saber que se era perdoado por Deus implicava remissão prática de dívidas e libertação da escravidão. A esperança intrínseca do Jubileu misturava-se com uma esperança escatológica de restauração final da humanidade e da natureza ao seu propósito original por parte de Deus”, frisou.    

O orador considerou assim que “para aplicar o modelo do Jubileu é necessário que se reconheça a soberania de Deus, confie na sua providência, conheça a sua ação redentora, experimente o seu perdão, pratique a sua justiça e espere o cumprimento das suas promessas”. “Afinal de contas é um modelo que se confunde com a própria missão evangelizadora da Igreja”, considerou.  

Na primeira parte da sua alocução, o sacerdote recordou que “o Ano Jubilar está profundamente ligado ao ano sabático”, sendo “o que se segue ao ciclo de sete anos sabáticos”. 

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O sacerdote realçou ainda que “a partir da realidade sociológica do parente que deve salvar e pagar a dívida do seu parente empobrecido”, ocorre um “salto lógico teológico” em que “é Deus a fazer isso por todos aqueles que precisam de salvação”. “Por isso, não é de estranhar que Deus seja retratado como o redentor dos oprimidos, viúvas, estrangeiros e pobres”, afirmou.

A atualização do clero das dioceses do sul de Portugal, que está reunido em Albufeira no Hotel Alísios, decorre, promovida pelo Instituto Superior de Teologia de Évora, até quinta-feira.