Na conferência que apresentou no passado dia 13 de maio, o padre Mário de Sousa sublinhou que, nas aparições em Fátima, Maria “vem recordar o essencial do evangelho – penitência e oração” –, ou seja, o apelo a “mudar a vida, de acordo com o projeto e a maneira de pensar de Deus”.
“Esta é a verdadeira penitência, a que custa. Não é a penitência das promessas, não foi essa que Nossa Senhora pediu porque não é essa que Jesus pede. O que Jesus pede é uma que custa muito mais, que é a mudança do coração, a mudança da nossa forma de sentir, de pensar, dos nossos critérios de vida, da nossa forma de conformar a existência: a conversão”, sustentou o sacerdote na conferência online sob o tema “«Era uma Senhora mais brilhante que o Sol» – As aparições de Fátima à luz da Bíblia”, promovida pela diocese algarvia, através do Centro de Estudos e Formação de Leigos do Algarve (CEFLA), de que é diretor.
E porque “humanamente é muito difícil”, para que essa “penitência” seja possível, o biblista acrescentou ser necessária a “ajuda e graça de Deus”, através da oração. “E a oração é, sobretudo, a escuta de Deus. Não é dizer coisas a Deus. Essa é uma parte da oração”, advertiu, o orador que fez questão de realçar que “as revelações privadas não acrescentam nada àquilo que está na Bíblia, mas acontecem para recordar ou sublinhar aspetos importantes” da “revelação pública” de Deus à humanidade “que atinge a sua plenitude em Jesus”.
Mas ainda assim, o padre Mário de Sousa destacou que o primeiro conteúdo da mensagem de Fátima não é esta “mensagem central da necessidade da penitência e da oração”, nem o chamado segredo, mas “a própria aparição, isto é, a mensageira: Maria de Nazaré”.
Por outro lado, o conferencista alertou que “só à luz da revelação pública, ou seja, da Bíblia lida pela tradição e guiada pelo Espírito Santo, o mesmo que inspirou os autores bíblicos”, é que se pode “entender o sentido da mensagem das revelações privadas” e, nesse sentido, considerou o texto do livro do Apocalipse como “fundamental” para se compreender a imagem que a irmã Lúcia transmite da Senhora que lhe apareceu. “A experiência de João em Patmos, vidente do livro do Apocalipse, ele que viu a «mulher revestida de sol», é a mesma experiência dos pastorinhos em Fátima”, relacionou.
“A «mulher revestida de sol» é uma referência às duas realidades: ao Israel fiel, do qual nasceu Jesus, e, ao mesmo tempo, refere-se à Igreja porque a Igreja continua a gerar Jesus naqueles que guardam o seu testemunho”, sustentou, ressalvando que “o brilho de Maria não é próprio, mas é recebido d’Aquele que é o sol”. “Tal como no rosto da Igreja, a luz do Senhor resplandece na pessoa e na vida de Nossa Senhora, Mãe da Igreja”, completou, acrescentando que “Deus, pelo poder que tem e que a reveste a ela de luz, ilumina e através dela ilumina todos”. “Ela é o grande sinal que no céu aparece porque foi grande sinal também na terra, revestida de Deus como sempre viveu”, concluiu, evidenciando que também a «mulher revestida de sol» “aparece no céu porque em Maria está a Igreja revestida da luz de Deus”.
O padre Mário de Sousa enumerou ainda nove caraterísticas de Nossa Senhora, lembrando, por exemplo, que “ela foi a primeira a acreditar, a primeira discípula, a primeira a dizer sim a Jesus, a primeira missionária de Cristo ou a primeira a ser proclamada bem-aventurada” e “a grande testemunha de Jesus”. “Por isso, é que Jesus no-la entregou como Mãe e foi nessa sua missão materna que ela veio a Fátima”, salientou, acrescentando que “em Fátima, e em tantos lugares onde se tem manifestado, Nossa Senhora dá continuidade à sua missão de discípula e, por vontade de Deus, Mãe da Igreja, Mãe de todos”.
Devoção ao Imaculado Coração de Maria
O padre Mário de Sousa explicou que “o coração de Maria é imaculado, não por conquista própria, mas porque é cheio da presença de Deus onde o pecado não tem lugar”. “Ao dizer aos pastorinhos que o seu Imaculado Coração triunfará, Maria fala do triunfo da presença de Deus em todos os corações humanos quando estes deixarem de ser a residência para ressentimentos, maus pensamentos que envenenam a alma e transbordam em palavras que ferem e que matam, em atos que roubam a alegria e assassinam a paz do coração do próximo, de omissões que são o resultado do egoísmo e do egocentrismo. Por isso, a devoção ao Imaculado Coração de Maria que Nossa Senhora pediu em Fátima é, por outras palavras, configurar o nosso coração ao seu coração”, explicou.
“O coração materno de Maria triunfará quando nos deixarmos por ele educar como filhos que, verdadeiramente, a amam e estimam, recebendo-a como o discípulo amado junto à cruz”, completou.
Devoção dos primeiros sábados e visão do inferno
O sacerdote deixou claro que “o desejo de Nossa Senhora da devoção dos primeiros sábados com a participação na eucaristia – o que envolve também a participação comunitária eclesial –, é uma luta contra a tentação de quem pensa que se pode salvar sozinho”. “Precisamos da Eucaristia que significa a graça e a presença de Jesus em nós e precisamos da comunidade na qual a Eucaristia se celebra”, sustentou.
“Maria alimentou Jesus, mas, sobretudo, alimentou-se d’Ele e desde a primeira hora o transportou como alimento que conforta, fortalece e transforma a tristeza da vida em alegria da esperança de quem sabe que o Senhor não nos abandona nem nesta vida, nem na próxima. O que pode a acontecer é que se sejamos nós a abandoná-l’O, escolhendo viver sem Deus, aquilo a que podíamos chamar o ateísmo prático, o que na linguagem teológica chamamos inferno”, prosseguiu, garantindo que “o inferno não é um lugar, mas um estado” porque “na eternidade não há espaço nem há tempo”. “Se o céu é a presença de Deus, o inferno é a ausência de Deus, uma ausência que faz sofrer o coração materno de Maria, que, por isso, veio pedir a conversão dos pobres pecadores que são todos aqueles que vivem na pobreza da ausência de Deus”, descodificou, acrescentando que “o fogo do inferno é uma imagem que representa este sofrimento incomensurável de viver para sempre ausentes de Deus e da sua luz”.
“Nossa Senhora em Fátima veio recordar-nos o essencial do evangelho para que, acolhendo do seu coração materno o amor das palavras com que se nos dirige, possamos acolher em nós a própria presença de Jesus e assim transformar já esta terra na presença do céu”, concluiu.