Conta-se que quando Paulo VI veio a Fátima em 1967, o Doutor Salazar que estava muito aborrecido com o Papa por causa do antigo Estado Português da Índia e do Congresso Eucarístico de Bombaim, onde o Papa se deslocara para desgosto do Presidente do Conselho, terá ponderado não ir receber o Papa à Base aérea de Monte Real. Mas, enfim, o Presidente lá acabou por ir e quando encarou o Papa genufletiu, beijou o anel e disse: Vossa Santidade! Paulo VI ergueu Salazar e numa indireta à sua longa permanência no poder, retorquiu amistosamente: Vossa Eternidade! Este episódio e estas palavras têm sido algumas vezes glosadas por mim, quando quero brincar com o meu querido amigo Monsenhor Sezinando Oliveira Rosa, fazendo alusão à sua longevidade. Assim, quando chego junto dele e já não nos vemos há alguns dias, brinco com ele perguntando: Então como tem passado Vossa Eternidade? Ele lá responde, no meio de sorrisos, aliás o seu rosto ilumina-se de alegria sempre que falamos desses tempos em que ele foi um protagonista da história e esteve por dentro de muitos segredos e episódios, nomeadamente dos relacionados com a visita de Paulo VI a Portugal em 1967, época em que ele desempenhava as funções de Diretor do Secretariado Geral da Conferência Episcopal Portuguesa. Pois, "Sua Eternidade" Monsenhor Sezinando, completou no passado dia 20 de Julho, cem anos! Graças ao Pai do Céu, como ele próprio diz!

Segundo ele conta, sua mãe dizia que ele nasceu na manhã de um Domingo, quando o sino da igreja de Vila Real de Santo António tocava à "elevação", à consagração, como agora se diz. Quando mais tarde, o jovem Sezinando quis entrar no Seminário de Faro e foi ordenado sacerdote, sua mãe, que guardara o momento do parto no seu coração, não pôde deixar de ver nessa coincidência um sinal de Deus.Um sinal de Deus é sem dúvida, também, a sua longevidade. Não é para toda a gente completar cem anos e Monsenhor Sezinando é o sacerdote mais idoso do País e o mais antigo em ordenação. Nasceu em 1911 e foi ordenado em 1934. 100 anos de vida e 77 de sacerdócio. Há dois anos reunimo-nos em Vila Real de Santo António para celebrar as bodas de diamante da sua missa nova, agora em Alcantarilha, onde reside, para dar graças a Deus pelo seu centenário!

O que mais impressiona, é que isto acontece com alguém que marcou a juventude e foi uma grande referência para os católicos portugueses do século vinte. Nos anos quarenta, cinquenta e sessenta do século passado, Mons. Sezinando como Secretário-Geral da Acção Católica Portuguesa galvanizou o País, em Congressos, Peregrinações e outras jornadas, que tinham o seu ponto culminante anual no dia da Acção Católica, no último Domingo de Outubro, Festa de Cristo-Rei. Quando estivemos os dois na Paróquia da Guia, entre 2000 e 2003, encarregava-me muitas vezes de fazer a homilia, mas no Domingo de Cristo-Rei nunca aceitava e pedia-lhe para ser ele a nos falar desses tempos gloriosos da Acção Católica.

Amou e serviu a Igreja, no Algarve e no País, nos mais altos postos e responsabilidades. Tem um curriculum sacerdotal verdadeiramente singular. Nunca foi um teórico, mas um homem de acção, um organizador, com elevado sentido prático das coisas e apesar de ter sido tudo aquilo que foi na Igreja em Portugal e ainda Vigário Geral da Diocese do Algarve, não se importou que a sua última nomeação canónica fosse, com 89 anos de idade, para Administrador Paroquial da Guia, uma pequena Paróquia perto da sua residência. Deu a mesma resposta que tinha dado quando o convidaram para ir para Lisboa: "Fui ordenado para servir onde a Igreja precisar de mim".

Monsenhor Sezinando, uma "eternidade" de amor e serviço à Igreja, é um exemplo de humildade, simplicidade, zelo e dedicação, para todos nós, particularmente para os padres, diáconos e catequistas, nestes tempos de nova evangelização.

Luís Galante