Os “novos” quiosques junto ao monumento de Ferreira de Almeida, na doca de Faro, e os recentes parquímetros de estacionamento na “nova” periferia da cidade, são o “objecto” da próxima crítica.

Nunca na via pública se implantou tão curiosa “inovação”, depois dos postes projectores de luz da Sé Catedral e das 12 cabanas para pescadores junto ao Castelo. Os primeiros foram providencialmente retirados, as segundas jazem já destelhadas e sem qualquer utilização. E o que dizer acerca das várias centenas de palmeiras…, cantadas em muitos poemas de «O HERALDO», jornal de Carlos Lyster Franco e que perfaz esta semana 100 anos, depois, poetadas nas colunas «Futurismo-Gente-Nova» no mesmo semanário e da responsabilidade de Carlos Filipe Porfírio, …também jazem nas raízes de um “memorial” ao esquecimento patrimonial.

A cidade abunda de equipamentos obsoletos, tais são; os inúmeros caixotes de lixo ladeando os principais monumentos (Arco da Vila, Igreja da Misericórdia, Paço Municipal…), a múltipla sinalética em plena “Vila Adentro”, os diversos e excessivos pinos de pavimento (bolas, cilindros, prismas, verdes, negros, cinzentos, metálicos, de fibro-cimento, deslocados…), as esplanadas desarticuladas invadindo o espaço público sem ordenamento e com: muitos e anormais modelos de cadeiras e mesas, diversificados tipos de guarda-sóis, múltipla publicidade e bizarra informação, num excessivo jogo formal confuso e “colorido”, que desvaloriza o conjunto patrimonial e a própria cidade. Até tem um comboio de pneumáticos e que muda de cor com o tempo… ou outro ainda que verdadeiro troca de forma quando passa pela ponte metálica, carregando por vezes só hieróglifos… Mas, na paisagem da “doca”, não existe muito curiosamente nem um barco à vela…

«Hela-hoho comboio, automóvel, aeroplano minhas ânsias,…» «Passagem das Horas» na imaginação poética de Álvaro de Campos, «mas tudo isto foi o Passado, lanterna a uma esquina de rua velha,…» numa «Ode Marítima», e até teve uma velha e querida tia que «às vezes… cantava a “Nau Catrineta”…». Mas essa nau existe hoje desenhada, na calçada e pormenor ao centro do jardim Manuel Bívar, imaginada por Lyster Franco Pintor, e quando foi Presidente da autarquia o seu filho Mário.

O equipamento urbano sempre foi verde-escuro, em ferro forjado, de madeira envernizada ou pintada, pára-sóis de tela branca e, com formas secularmente tradicionais. Já nos chega a substituição dos candeeiros em ferro forjado do séc. XIX na baixa de Lisboa, em pleno Terreiro do Paço, por asses de iluminação de gosto duvidoso, e com o seu pavimento sintético em formatos de losangos futuristas. Nem uma única árvore foi aí implantada. Nem sequer jaz «A… Nau Preta» numa alusão à «Passarola voadora» do Padre Bartolomeu de Gusmão, mas “mil e um” aparelhos de ar condicionado pendurados nas sacadas do “hall” de entrada da Capital e de Portugal, e contrastando com o amarelo berrante das fachadas. Que diria o “Pintor” de versos futuristas do café «Martinho da Arcada»? ou do «Arco de Triunfo» na Rua Augusta? Parece até que a calçada portuguesa foi banida do vocabulário arquitectural!.

Voltando aos 6 “quiosques” da doca, o seu carácter amovível não justifica a descaracterização “temporária” da capital do Algarve. Vamos «Refazer a Capital Regional» com Macário Correia já em 2012, e com pelo menos um ou dois «Planos de Pormenor»: o da «Cidade Velha», outro do «Espelho de Água» e, em permuta da velha “doca”. A capital precisa refazer a tradição e o passado, muito para além da notável intervenção com o “novo” arranjo de pavimento das ruas no centro de Faro, à maneira “antiga”, em pedra sienito, calçada miúda e replantação de muitas palmeiras, e “acção” notável de Luís Coelho e, João Botelheiro. Faro necessita (com urgência) da autoridade de Arquitectos habilitados mas, outrossim, de especialistas com imaginação junto a Pintores e Poetas mas, igualmente autores responsáveis de uma “Ponte”, arco-íris da aliança entre o “futuro” e o “passado”.

Do alto do «Arco de Triunfo» na Praça do Comércio em Lisboa ou do «Arco da Vila» na Praça D. Francisco Gomes do Avelar, Álvaro de Campos, cidadão de «PORTUGAL FUTURISTA» (1), «(…nascido no Algarve, educado por um tio-avô, padre, que lhe instilou um certo amor às coisas clássicas). (Veio para Lisboa muito novo…)», e diria:

E eu sinto que sou o Arco, e o espaço que ele abrange,
E toda a gente que passa,
E todo o passado da gente que passa,
E todo o futuro da gente que passa,
E toda a gente que passará
E toda a gente que já passou.

Vítor Cantinho
Arquitecto e crítico de Arte

(1) Revista fundacional do Futurismo, e que se “oficializou” também em Faro.

O autor deste artigo não o escreveu ao abrigo do novo Acordo Ortográfico