Olho para as cidades que percorro e procuro ver nelas os sinais da presença de Deus. Primeiro, busco no que é mais óbvio e que todos reconhecem: a arquitetura. As Igrejas, monumentos e outros sinais de que Deus se manifestou às gentes recordam-nos que Ele se tornou vivo para tantos, para todos aqueles que O acolheram como seu Senhor. Nestes templos, mais ornamentados, mais simples, com traços mais antigos ou mais contemporâneos, reúnem-se os fiéis, em busca de conforto, da Palavra que se pode fazer vida nos gestos do quotidiano. E a Arte, presente em todos os séculos, dá nota de como, à semelhança do Nosso Criador, somos filhos do Belo, garimpeiros da perfeição. Não está Deus presente numa pomba criada por Pauline Ohrel, com rede e arame, suspensa no alto de uma bela catedral gótica? Não nos guia para um Deus que nos legou essa capacidade de criar, pensar, comunicar através da Arte?
Depois olho em volta e busco os sinais da presença de Deus na natureza. Que belezas infinitas fez O Nosso Pai! Estar no alto de uma montanha e ver a floresta, a neve, as crianças e adultos que aproveitam este ambiente para sua descontração, para partilhar a alegria que é dom Dele, revela, igualmente, o cuidado que teve em nos deixar um lugar para vivermos, no qual pudéssemos, sempre que tenhamos o olhar atento, encontrá-Lo e louvá-Lo.
Por fim, olho para os outros, aqueles que como eu deambulam pelas ruas, apenas para descobrir nelas aquilo que não conhecem, ou aqueles que, apressados e embrenhados nos seus afazeres, correm para um qualquer sítio, para um outro alguém, para um momento de descontração ou para um trabalho. Que sei eu deles, senão o que os sinais exteriores que trazem consigo me dizem? Sei se são felizes, ou não? Sei que qual a sua Fé, ou não? Sei qual a sua orientação sexual, ou não? O que sei desta gente que passa a meu lado, que se senta à minha frente num transporte público, que segue em grupo na rua, rindo feliz ou que parece fugir, num passo apressado, marcado pela sombra da tristeza? Que sei eu deles, a não ser que são, como eu, Filhos do mesmo Deus?
Neste final da Quadra Natalícia, ao cruzar-me, assim, com europeus ocidentais e de leste, africanos, magrebinos, sul e norte americanos, cidadãos do médio oriente, não posso deixar de estabelecer uma relação clara e concreta com o que nos foi transmitido pela Palavra de Deus. Dizia Isaías (60,1-6) «Os povos caminham à tua luz, e os reis ao clarão de tua aurora. Levanta os olhos ao redor e vê: todos se reuniram e vieram a ti». E o Salmo (71, 1-2.7-8.10-11.12-13 (R. Cf.11)): «As nações de toda a terra, hão de adorar-vos ó Senhor!»
Pergunto-me: é assim mesmo? Somos capazes de ultrapassar todas as nossas diferenças, preconceitos, barreiras para, como uma só Humanidade, louvar a Deus, mesmo que de formas diferentes? Os últimos Papas e, sobretudo Francisco, têm procurado uma aproximação clara a todos os crentes – judeus, muçulmanos, budistas, hindus, cristãos de várias confissões -, dando nota, como se diz nos Atos dos Apóstolos (10, 34-38), de que «Deus não faz aceção de pessoas, mas, em qualquer nação, aquele que O teme e pratica a justiça é-Lhe agradável». Têm procurado aproximar-se das periferias, como menciona Francisco: as mulheres, os pobres, os refugiados, a comunidade LGBTI+. Ao fazê-lo, são alvo de críticas, que não compreendo, sobretudo olhando para o Evangelho como nosso Guia e testemunho da Palavra e vontade de Nosso Senhor. Nãos compreendo, olhando para o testemunho deixado por Jesus, que a todos acolheu e com todos se sentou e comeu. Não entendo, sobretudo porque Deus é Misericórdia e Amor e estes são inclusão e aceitação.
Quando ando por aqui, por esta terra, dentro de mim vai sempre a frase de Isaías (42,1-4.6-7): «Fiz de ti a aliança do povo e a luz das nações». Olho para os outros, para a bela Arte e para o maravilhoso Planeta e sinto, sobre mim, a mão de Deus que me pede, enquanto Seu filho, que cuide destas dimensões da existência e que em nada faça aceção de pessoas, sentimentos, talentos. Pede-me que seja um sinal de uma Igreja para o Mundo, uma Igreja que viva com e para o mundo e que não passe apenas por ele, sem abrir, com espanto e ternura, o olhar para os sinais que Ele nos dá.
A todos desejo um bom ano de 2022!