O executivo municipal de São Brás de Alportel aprovou a 09 de setembro, em reunião de Câmara, por unanimidade, a inscrição da Procissão de Aleluia no Inventário Nacional do Património Cultural Imaterial.

Este inventário constitui um registo oficial das tradições, práticas e conhecimentos que integram a cultura portuguesa, garantindo a sua preservação e valorização. O processo envolve a participação das comunidades na identificação e descrição das manifestações culturais, contando também com o apoio de especialistas.

A autarquia justifica que “a proposta aprovada baseia-se na singularidade, no valor simbólico e na relevância da Procissão de Aleluia para a comunidade e para o concelho de São Brás de Alportel, tanto no plano da fé como da memória coletiva e da criatividade transmitida entre gerações”. “Trata-se de uma tradição com registos históricos documentais e iconográficos, cuja valorização tem sido promovida pelo Município de São Brás de Alportel, em conjunto com a Associação Cultural Sambrasense e com Paróquia local, com a colaboração de associações e entidades e o envolvimento da comunidade”, refere em comunicado.

“Em 2015, foi dado início ao processo de inscrição desta manifestação cultural no Inventário Nacional, pela mão da Associação Cultural Sambrasense, com o apoio do município que entretanto produziu elementos de registo importantes para o processo. Este objetivo é agora retomado através da criação de um grupo de trabalho multidisciplinar, encarregado de elaborar o pedido de inventariação junto do Instituto dos Museus e da Conservação, IP”, acrescenta o documento, referindo ainda que “a este esforço junta-se a colaboração da Unidade de Cultura da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Algarve, que está já a trabalhar em conjunto com a equipa municipal”.

“Este é um passo importante para reforçar o reconhecimento da Procissão de Aleluia enquanto património cultural imaterial, a nível regional e nacional”, conclui a Câmara Municipal.
A Procissão da Ressurreição, mais conhecida como Procissão de Aleluia, faz parte da Festa das Tochas Floridas, uma manifestação popular da fé em Jesus Cristo ressuscitado realizada em Domingo de Páscoa.
A Procissão da Ressurreição é composta pelas tochas floridas, onde os andores dão lugar às flores que ornamentam as trabalhadas tochas e as ruas, depois de uma longa madrugada de trabalho em que centenas de voluntários se lançam na árdua tarefa de preparar os tapetes floridos.

As ruas, engalanadas também com bandeiras vermelhas e brancas, colchas penduradas às janelas e lonas com a imagem de Cristo ressuscitado, transformam-se num «mar» de tochas floridas com os homens a abrir a procissão, formando alas e empunhando na mão uma tocha.

Ao longo do cortejo reúnem-se em pequenos grupos para, alternadamente, levantarem o grito do “aleluia”. Aqui e além ouve-se uma voz potente e sonora: “Ressuscitou como disse!”. O grupo, erguendo bem alto a tocha, responde: “Aleluia, aleluia, aleluia!”.
O historiador e antigo vigário paroquial de São Brás de Alportel, padre Afonso Cunha Duarte, explica que “esta procissão foi outrora popular em todo o Algarve”, realizando-se presentemente também ainda em Portimão.

No século XIX “praticamente todas as aldeias organizavam esta Procissão da Ressurreição”, na qual as pessoas levavam nas mãos uma vela que antigamente “era designada por tocha”, conta o sacerdote. Também conhecida como a Procissão das três Marias (em alusão às mulheres que se deslocaram ao túmulo de Jesus na manhã da ressurreição), as confrarias, responsáveis pela organização, eram então obrigadas a levar uma tocha acesa ou luminária e as opas vestidas. Posteriormente, a falta de cera levou ao aparecimento de paus pintados e ornamentados com flores, no cimo do qual se colocava uma pequena vela.

Mais tarde, com o desaparecimento das confrarias, permanecem na procissão os paus enfeitados, as lanternas e as velas acesas ao lado do pálio e as opas, que ainda hoje são usadas pelos homens que transportam o pálio. “Ao longo da procissão, cantavam-se hinos, responsos e o aleluia, em honra da Ressurreição do Senhor. Antigamente havia também um ou dois coros a cantar e o povo respondia, mas com o passar do tempo, a falta de clero e de cantores, levou a que o canto ficasse na boca do povo. Com a implantação da República esta situação, que era comum em todas as paróquias, alterou-se, pois, as manifestações públicas foram proibidas. A tradição das procissões esmoreceu”, refere o padre Cunha Duarte que, a título de exemplo, relembra que, em Lagos, a primeira procissão apenas voltou em 1941.
Com a ida do recentemente falecido e antigo pároco, padre José Cunha Duarte, (irmão do padre Afonso Cunha Duarte) para a paróquia de São Brás de Alportel em 1981, a festa foi recuperada e nunca mais cessou.