Falando aos peregrinos reunidos na Praça de São Pedro, no Domingo 22 de Maio, o Papa Bento XVI evocou a figura da fundadora das Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição, que ensinou "a alumiar e aquecer" a multidão de pobres e esquecidos da sociedade, vendo e acolhendo neles o próprio Deus. "Alumiar e aquecer" era o lema da nova Beata Maria Clara do Menino Jesus. No meio da pobreza imerecida das multidões que a procuravam, pobreza espiritual e pobreza material de muitos, para não dizer mesmo da maioria dos portugueses do século XIX. Esta mulher, Libania do Carmo Galvão Mexia de Moura Telles e Albuquerque, que apesar de ter nascido numa família nobre em 15 de Junho de 1843, a terceira de sete irmãos, ao ficar órfã na adolescência, cedo conheceu as dificuldades da vida, sendo educada durante cinco anos no Asilo Real da Ajuda, depois numa família amiga que a acolheu e finalmente no Pensionato de S. Patrício. Este percurso, preparou-a para ser sensível às carências e sofrimentos alheios. Por isso, ela e a Congregação que fundou se dedicaram desde os primórdios a acolher e amparar os mais desfavorecidos. Daí o lema "alumiar e aquecer": "alumiar" a pobreza espiritual e cultural, o analfabetismo e a ignorância religiosa que, então imperavam na sociedade portuguesa, com a luz da Palavra de Deus e da Igreja e "aquecer", confortar, consolar, com o pão e o vestuário os famintos e andrajosos gerados aos milhares pela economia liberal dos idos de dezanove que confiava cegamente nas virtualidades do mercado.

De tal modo isto é assim, que os Bispos portugueses referem na nota pastoral que publicaram a propósito desta beatificação, que "a gesta caritativa da Congregação das Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição documenta a vitalidade interna da Igreja Católica no final do século XIX. Não é possível escrever a história da assistência e da educação em Portugal nessa época sem referir o contributo abnegado das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras".

A sua sensibilidade feminina, o seu compromisso cristão e sua matriz franciscana, não lhe consentiam ficar indiferente perante o sofrimento alheio, particularmente das crianças e dos idosos, empenhando-se em minorar e aliviar a dor dos mais débeis, de tal modo que passou a ser conhecia por "Mãe Clara" e a ser vista como um "rosto da ternura e da misericórdia de Deus". No século XIX, em plena Monarquia Constitucional liberal que a partir de 1834 condicionou a acção da Igreja e especialmente das Congregações religiosas, a Beata Maria Clara do Menino Jesus, enfrentou grandes dificuldades e sofrimentos pessoais de que o célebre caso da morte da jovem Sara Matos, em 1891, numa casa das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras foi talvez o incidente mais perturbador e motivador de calúnias e ataques por parte dos inimigos da Igreja.

Em contexto histórico muito diferente, a nova Beata portuguesa pode inspirar-nos contudo para enfrentarmos os actuais adversários da Igreja, mais dissimulados e refinados na hipocrisia e no fingimento que os seus antepassados do século XIX e que por vezes até fingem ser amigos; porém, parece ser no campo da solidariedade social, face às agudas dificuldades de sobrevivência sentidas por tantos portugueses de hoje, que o exemplo da Bem Aventurada Maria Clara do Menino Jesus nos pode impulsionar no serviço aos mais pobres, para que possam ter uma vida mais consentânea com a dignidade da pessoa humana e para que todos possam ver na Igreja e em cada um dos seus membros um "rosto da ternura e da misericórdia de Deus".

Luís Galante

O autor deste artigo não o escreveu ao abrigo do novo Acordo Ortográfico