
Só estive seis horas no centro da cidade de Bruxelas. Mas no aeroporto de Bruxelas, se contabilizasse todas as horas seguidas noturnas e diurnas que ali passei, somariam alguns dias seguidos. Aliás, nos últimos três anos já dormi mais vezes no aeroporto de Bruxelas do que na minha cama, na casa dos meus pais.
Conheço os cadeirões mais confortáveis, os sítios menos iluminados e barulhentos, todos os lugares onde um viajante em escala pode descansar um pouco. Por esse e outros motivos, tenho com aquele espaço uma relação conforto e uma sensação de casa como não tenho com mais nenhum aeroporto no mundo.
Já lá rezei, comi e passeei. Já lá estive sozinho e em grupo. Já lá ri e brinquei e lá passei algumas horas de sofrimento e irritação.
Todas as vezes que fui a Israel fiz escala lá. Não simpatizo particularmente com estilo de vida judaico e sinto algum desconforto diante do modo como se vive nos países árabes do medio oriente. Essa sensação de desconforto aumenta a minha vontade de voltar a casa e o primeiro espaço onde tenho a sensação de ter regressado é o aeroporto de Bruxelas. Ao chegar de Telavive tenho e tive sempre a sensação de chegar a casa e de me sentir em segurança.
E acho que é exatamente isto que o terrorismo do estado islâmico/daesh odeia. Engane-se quem pense que estamos a viver uma guerra religiosa. Estamos a viver uma guerra de civilizações. De um lado estão aqueles que defendem a ordem, a vida, a liberdade, o respeito pelo outro e pelo mundo e pela pluralidade da criação; do outro estão os que, sob a capa do “divino”, defendem o caos, o medo, a opressão, a violência, a ditadura e uma única forma de vida: a que lhes pode garantir, sem qualquer dúvida, um estatuto de poder inquestionável e total. Independentemente do lugar onde nascemos, nós e os membros do estado islâmico/daesh temos identidades e valores contrários e inconciliáveis.
O mundo está mais pequeno, mas também está mais perigoso e inseguro, precisamente por isso. E se já tiraram o sono a muitas pessoas e a vida a tantas outras, facto que me horroriza, agora atacaram um lugar onde eu e tantos outros nos sentíamos seguros, onde dormíamos em paz e descansados…