Padre Miguel Neto

Chego à hora marcada para o pequeno-almoço. No dia anterior, havendo dificuldade de agenda para ambos, decidimos que a melhor forma de nos encontrarmos seria às 8:30, para tomarmos esta refeição juntos e conversamos sobre os diversos assunto que nos unem.

Sei que ele é Espanhol, penso que da Andaluzia. Mas não. É da Catalunha. E a conversa, a quinze dias de um referendo independentista ilegal, desemboca para aí.

Não tinha opinião formada sobre o caso específico, mas expus-lhe o meu pensamento: havendo uma independência da Catalunha, tal facto iria desenrolhar uma serie lutas independentistas e fomentar autonomias noutras zonas de Espanha e até da Europa, como a Galiza, o País Basco, a Escócia, etc.

Sabendo que sou padre, desabafou a dificuldade que é pertencer a uma tradicional família catalã independentista e, ao mesmo tempo, viver com alguém que é andaluz e nacionalista. O assunto central da vida espanhola na atualidade torna-se assim um tema tabu naquele lar. Quando surge é motivo de discussões verbais conjugais e fratricidas.

Ouvindo, facilmente me apercebi que, mais importante que o problema identitário, é a existência de um forte problema económico. A Catalunha é, em larga escala, a região que mais produz e a contribui para a riqueza espanhola. Querem a independência, porque têm o sonho de gerir a riqueza que produzem sozinhos. É legítimo? Sim. É racional? Não. Há fatores socioeconómicos que provocarão a fuga dos mais diversos capitais para fora desta região se a independência for declarada. E isso poderá fazer perigar a tal saúde económico financeira que tanto orgulha os catalães…

Mas não é legítimo, nem racional que o governo espanhol seja o maior “promotor “ da independência da Catalunha através da proibição de as pessoas manifestarem livremente a sua vontade e muito menos com agressões bárbaras e gratuitas a gente que só queria participar numa votação que, afinal de contas, não era sequer uma ameaça, uma vez que não tinha qualquer validade legal. O crédito às más ideias vem da pouca ou muita importância que lhes damos e o governo espanhol deu maior crédito ao desejo independentista do que se contava ou desejava.

Do mesmo modo, também não é correto fomentar a separação que se sabe pode ser uma bola de neve neste nosso mundo tão frágil geopoliticamente, acirrar os ânimos, expor os cidadãos a uma situação que se sabia, quase de certeza, que aconteceria e, por isso, a Generalitat agiu de modo irresponsável e tonto. Mais: porque não ponderou, nem pondera, creio eu, as consequências mais latas que poderão resultar da independência da Catalunha.

E agora, a questão mantém-se: aqui ao nosso lado temos um país, duas identidades (ou mais…), a mesma nação, ou teremos, em breve, novos mapas, com novos nomes, com histórias mais ou menos felizes e que poderão não ser únicas?