© Samuel Mendonça
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“A solidariedade social assumida pelo Estado está a revelar-se insustentável. Isto significa que chegou a hora da responsabilidade social, chegou a hora das instituições da sociedade”, apelou  Manuel Braga da Cruz no último sábado nas XIII Jornadas de Ação Sóciocaritativa, promovidas pela Diocese do Algarve, em que participaram 97 pessoas de toda a região algarvia, acrescentando que isto não significa “desresponsabilizar o Estado”.

Na iniciativa, que teve lugar no Centro Pastoral e Social de Ferragudo sob o tema “Família, crise e solidariedade”, organizada pela Caritas Diocesana do Algarve, o conferencista disse que “o Estado fez mal ter impedido que as pessoas que davam educação e saúde tivessem sido afastadas dessas funções”, considerando que “muitas das Misericórdias foram marginalizadas”. “O que assistimos foi à destruição de muita da iniciativa da sociedade. Não foi o Estado a pôr a mão por trás da sociedade quando ela não era capaz de fazer. Foi o Estado a dizer: «eu tomo conta disto porque só eu sou capaz de prestar justiça social». Este é o grande erro que foi cometido”, criticou, considerando uma “aberração” a “ideia de que o serviço público só pode ser prestado pelo Estado e não por instituições da sociedade civil”.

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Braga da Cruz disse que o mesmo aconteceu com a educação. “No começo da década de 70, curiosamente em nome da democratização, estatizou-se tudo”, afirmou, defendendo que “o Estado tem que garantir” mas “não tem que prestar”. “Temos uma excessiva dependência do Estado. Onerámos o Estado em dinheiro, em burocracia, em recursos, em estruturas. O Estado ficou gordo mas não ficou forte, cresceu, alargou o seu âmbito, mas nem por isso ganhou força autoridade e vigor para impor o bem comum sobre os bens particulares”, disse, considerando que hoje se vive uma “situação dramática” com o “Estado refém de interesses”.

Considerando que “não há democracia sem equilíbrio das contas públicas”, o ex-reitor da Universidade Católica Portuguesa disse ser “testemunha de enormes desperdícios no ensino superior”. “Há muita gente que está a usar mal os dinheiros públicos”, denunciou, considerando ser “muito difícil mexer com os interesses instalados”.

Lembrando que na Alemanha, na Bélgica, na Holanda, na Hungria ou na Polónia, o Estado “financia as universidades católicas tal como financia as públicas” e que “na França laica” financia em 30%, tal como em Itália, o orador lamentou que em Portugal financie “em 0%”. “Temos uma história de mecenato educativo que foi sufocado pelo Estado (…) e agora temos um Estado que não é capaz de dar conta”, lastimou, considerando legítimo que o Estado apoie privados. “Mas o dinheiro público é dos funcionários públicos? Quando nos cobram impostos ninguém diz isso. Então não podemos dar subvenções a quem está desempregado? Isso não é uma transferência para um privado? Não se pode dar uma subvenção de maternidade a uma mãe? Que discurso é esse de dizer que o dinheiro público não pode ser transferido para um privado?”, questionou.

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Braga da Cruz, que disse que o totalitarismo é caracterizado pela “vontade de destruição do Estado”, lamentou ainda existir “um stresse fiscal muito grande em Portugal”. “Isto não é uma política liberal porque a política liberal não é uma política de desenvolvimentos dos impostos. Este stresse fiscal tem a ver com o facto que o Estado tem em reduzir os ingressos da dívida”, sustentou, defendendo ser “fundamental reduzir os impostos para permitir maior crescimento”. O orador, que entende haver “demasiado dinheiro tirado à economia pelo Estado”, defendeu ser preciso discutir qual o nível de despesa do Estado que se quer para a concomitante política fiscal.

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Considerando que criar emprego neste momento em Portugal é um “supremo ato de caridade”, o conferencista lamentou que a legislação do trabalho esteja “pensada toda ela para as grandes empresas”. “Temos de diferenciar o nosso Direito de Trabalho com a dimensão das empresas”, defendeu, lembrando que “a grande criação de emprego é de pequenas e médias empresas”.

Neste sentido desejou que as paróquias possam dotar-se de “estruturas de aconselhamento” que não sejam apenas um “centro de emprego”, mas que “ensinem como é que se pode criar uma pequenina empresa” e exortou os católicos à organização e à intervenção na política, advertindo que “a maçonaria está a tomar conta das instituições públicas europeias e nacionais”.