A coordenadora do Grupo VITA, criado pela Conferência Episcopal Portuguesa para acompanhamento das situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal, alertou os catequistas algarvios de que é preciso “antecipar riscos” e “conhecer para poder prevenir”.

Rute Agulhas, que falou por videoconferência no último sábado aos participantes do Dia Diocesano do Catequista que teve lugar em Lagoa, disse-lhes que “os catequistas são um dos públicos-alvo privilegiados” do Grupo Vita. “Temos planeado um plano de formação para este ano para os catequistas e para os professores de Educação Moral e Religiosa Católica (EMRC)”, informou.
Aquela responsável, que já trabalha naquela área há 25 anos, lembrou que aquele organismo já apresentou um manual de prevenção da violência sexual contra crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja católica em Portugal que se encontra disponível em https://grupovita.pt.

Rute Agulhas explicou que a formação é “dedicada a conhecer a problemática e a conhecer também quem são as pessoas que cometem crimes de natureza sexual”. “Não deixam de ser pessoas com direitos e um dos direitos é o de ser ajudadas. Ajudadas na perspetiva de prevenção da sua reincidência”, prosseguiu, assegurando que “quem comete crimes de natureza sexual, se nada acontecer, se não houver nenhuma intervenção terapêutica e, muitas vezes, medicamentosa também, psiquiátrica, a probabilidade de esse comportamento se repetir é muito elevada”. “Portanto, não basta olharmos para as vítimas. A pessoa que comete os crimes tem de ser ajudada para não voltar a cometê-los. Ao ajudarmos estas pessoas, estamos a prevenir outras situações de abuso e a proteger outras crianças”, justificou.
Aquela especialista disse ainda ser importante desconstruir “alguns mitos”, explicando que quem comete crimes de natureza sexual “não têm de ser necessariamente pessoas más, assustadoras, sem qualquer empatia”. “São pessoas que têm uma série de vulnerabilidades e dificuldades e que precisam de ser ajudadas e não apenas afastadas. Se não houver um processo terapêutico, dificilmente há um processo de mudança”, alertou.
Rute Agulhas anunciou que o segundo módulo de formação, com sessões online, será sobre “estratégias preventivas”, como se podem “antecipar riscos”, “o que podem ser situações de risco” e “medidas que podem adotar para prevenir essas mesmas situações”.

Aquela técnica referiu que “os catequistas, tal como os professores de EMRC, são figuras de confiança para as crianças”, alertando-os para a possibilidade de os catequizandos os procurarem para lhes contarem alguma situação de abuso. “Esta formação pretende também dotar-vos de algumas competências para saberem o que fazer e não fazer se obtiverem uma suspeita”, disse, advertindo que se a criança perceber que ficam “embaraçados perante o tema”, desiste de contar o que se está a passar.
Rute Agulhas disse que o Grupo Vita pretende apresentar no final deste ano “resultados de vários estudos” em curso e “dois deles têm como objetivo desenvolver programas de prevenção da violência sexual dirigidos a crianças: um para crianças dos 6 aos 9 anos e outro para crianças dos 10 aos 14”. Para estes últimos destinatários será lançado um jogo digital que vai ser dinamizado pelos catequistas, pelos professores de EMRC e pelos escuteiros. “Para as crianças mais pequeninas é um conjunto de atividades ilustradas, apelativas, com jogos com vídeos que podem utilizar para terem o mote para trabalhar alguns temas”, acrescentou, explicando que os temas serão abordados sem recurso a linguagem sexual explícita e com materiais adaptados para as várias faixas etárias, “desenvolvidos com a ajuda de todos” e envolvendo encarregados de educação.
“Temos de utilizar estratégias sempre lúdicas e apelativas porque as crianças aprendem a brincar, de uma forma descontraída”, justificou, garantindo haver “diferenças muito significativas nas crianças que passam por este tipo de programas”. “Ficam mais empoderadas, informadas, capacitadas, pedem ajuda mais cedo. Se alguma situação ocorrer com elas, dentro ou fora da Igreja, são mais rapidamente capazes de pedir ajuda e de sinalizar a situação. Os adultos que implementam estes programas também se sentem mais capacitados para agir, com menos dúvidas sobre o que fazer perante uma suspeita ou uma revelação de abuso sexual por parte de uma criança”, explicou.
Aquela responsável anunciou ainda a apresentação em junho do ‘Kit Vita’, uma ideia que surgiu dos professores de EMRC.

O bispo do Algarve considerou “muito importante” aquele trabalho. “Dá-nos esperança, confiança e serenidade sobre o modo como enfrentar da melhor maneira esta situação. Só com o contributo de todos sem medos e receios e com serenidade é que vamos conseguir assumir uma resposta para estas situações”, afirmou D. Manuel Quintas, acrescentando: “todos os subsídios que recebermos do Grupo Vita só nos virão a ajudar a adquirimos essa capacidade e serenidade de ultrapassar essa situação ou, pelo menos, a estarmos por dentro dela e sermos resposta serena, acolhedora para aqueles que nos procuram”.