O Museu Municipal de Faro inaugurou no passado dia 1 deste mês uma exposição sobre a obra do principal e mais famoso escultor e entalhador barroco algarvio: Manuel Martins.

Na cerimónia da inauguração, o diretor do museu destacou o artista – que viveu entre 1667 e 1742 e tinha oficina na antiga rua dos Capuchos (atual rua Serpa Pinto), uma das mais concorridas da época na região – como “sinónimo do barroco e de um Algarve que acompanhava as tendências artísticas do resto de país”, “alguém que dominava a arte como poucos”.

Marco Lopes explicou que a mostra, comissariada pelo historiador Francisco Lameira – que levou dois anos a ser preparada e que ficará patente no museu municipal até 18 de outubro deste ano – não é só sobre Manuel Martins. “É sobre a sua época, a sua clientela, os valores morais e artísticos”, elucidou, acrescentando que a mesma alude à “versatilidade de Manuel Martins visto como riscador, entalhador e imaginário, artista de grande sensibilidade e talento e atento ao que se fazia”.

“Por isso, se a exposição é uma síntese da obra e da vida de Manuel Martins, também é uma sugestão de roteiro cultural e turístico da retabulística e da imaginária barroca farense, que pode e deve ser fortalecido na sua divulgação e que pode deve ser potencializado na sua dinamização”, sustentou, explicando que a exposição é constituída por temas que têm o escultor como “protagonista” e “elo de ligação”.

Dois deles são as procissões, como “património imaterial importante na cidade”, e os Cristos Mortos, cujos quase 40 exemplares existentes no Algarve têm vindo a ser alvo de um estudo radiológico. Um deles, pertencente à igreja matriz de Santa Bárbara de Nexe, é na exposição o representante do grupo. Alvo de uma criativa solução para a exibição, a imagem encontra-se suspensa por cima de um espelho que permite ao visitante observá-la a toda a volta, enquadrada por uma envolvente, pedida pelo comissário da exposição, que ajuda a despertar os sentidos.

Para além da projeção de fotografias de arquivo da procissão do Enterro do Senhor em Faro, popularmente evocada como procissão do Senhor Morto, cedidas pelo Folha do Domingo, o perfume do rosmaninho espalhado no espaço destacado e o inconfundível som das composições de Carlos Seixas, «transportam» o visitante para Sexta-feira Santa.

“É uma exposição total, tal como total era a arte barroca”, referiu Marco Lopes, justificando que a mostra envolve “investigação, restauro, divulgação e educação”. “Um exemplo de serviço público a pensar na comunidade e naqueles que nos visitam”, completou, adiantando que da iniciativa resultará um catálogo “a lançar futuramente”.

O diretor do museu municipal destacou ainda o trabalho da equipa de restauradores daquela entidade que disse constituírem “uma espécie de oficina de entalhadores”. “Há imagens que chegaram com icterícia e sairão daqui tratadas”, metaforizou.

Marco Lopes concluiu que a mostra – constituída sobretudo por imaginária e por impressões de grande formato de alguns dos principais retábulos do entalhador – é sustentada pela investigação de mais de 30 anos do seu comissário. “Se a exposição é sobre Manuel Martins, não é menos verdade que não seja de Francisco Lameira”, enfatizou, lembrando que o historiador é “uma referência para todos”, “um orgulho para a cidade e para a região”.

Na sua detalhada exposição sobre a obra de Manuel Martins, Lameira considerou que a “fama” do escultor se deveu a ter sido “intérprete” das diretrizes artísticas que vinham de Lisboa. “O Manuel Martins executava, e mais do que executar, planeava. E nalguns casos, em algumas das suas obras, consegue meter parte da sua identidade que não corresponde à identidade algarvia”, afirmou o historiador sobre o entalhador que gostava de provocar “dinamização arquitetónica” nos seus retábulos com recurso a elementos com diferentes secções e de fazer com que o retábulo pareça ainda mais cenográfico do que realmente é.

Francisco Lameira identificou duas fases distintas nos trabalhos do artista, que disse ter sido o introdutor da segunda na região algarvia, e considerou o retábulo-relicário da capela do Santo Lenho na Sé de Faro, mandado executar por D. António Pereira da Silva, como “uma das melhores obras dos retábulos desta época, não só no Algarve, não só em Portugal, mas no mundo português”.

A exposição – cuja inauguração contou ainda com a atuação do grupo de flautas de bisel F3 que interpretou temas de música barroca – conta também com empréstimos e colaboração, para além da já referida paróquia de Santa Bárbara de Nexe, do Cabido da Sé de Faro, da Ordem Franciscana Secular de São Francisco de Faro, da Ordem Terceira de Nossa Senhora do Monte do Carmo de Faro, da paróquia da Sé de Faro, da paróquia de São Pedro de Faro, da igreja do Pé da Cruz, da ermida de Santo António do Alto e da Biblioteca Municipal de Faro.