Natural de Silves, onde nasceu a 14 de agosto de 1944, José Manuel Fernandes Águas foi batizado menos de um mês depois, a 11 de setembro daquele ano.
Os pais e os avós eram pessoas de prática cristã e foi no seio da família que, com os seus cinco irmãos, o pequeno José começou a aprender a fé. Nunca frequentou a catequese porque ela era feita em casa. “Foi a minha avozinha que me ensinou e a rezar. Eu ia à Missa com ela e, ficando ao seu lado, ia-lhe perguntando as coisas”, recorda, acrescentando que os serões eram muitas vezes passados a rezar o terço, enquanto se partiam as amêndoas trazidas do trabalho no campo a que se dedicavam os seus familiares. Os miolos recolhidos substituíam as contas do rosário.
Com seis anos fez a primeira comunhão e foi crismado por D. Marcelino Franco (bispo do Algarve entre 1920 e 1955) na igreja de Porches que os avós frequentavam regularmente, juntamente com a de Alcantarilha, por serem habitantes no lugar de Vale de Lousas, equidistante de ambas as localidades. “Havia uns 50 anos que o bispo não ia a Porches”, conta para evidenciar que a mobilidade naquele tempo era muito diferente. “Íamos à missa na burrinha”, recorda.
“Os meus avós é que foram os meus guias”, realça, evidenciando a marca indelével da fé deixada por aqueles educadores com quem viveu até ingressar na Escola Secundária de Silves, altura em que regressou a casa dos pais. “O meu avô era um homem analfabeto que tinha sido pescador e não sabia mais nada para além do Pai Nosso e da Ave-Maria. Na hora da morte, estando os filhos presentes e eu também, disse-nos: «Filhos, isto está no fim. Vamos cantar o “Bendito e Louvado”? Não acabou. Acabámos nós». Mais tarde, depois de estudar Teologia, o mistério pascal, o que é ressurreição e o sentido da morte, interroguei-me: «Mas quem é que ensinou isto àquele homem?». Isto foi algo que me marcou e me ajudou também a discernir a vocação”, conta, lembrando que na altura já frequentava o “segundo ou terceiro ano do Seminário”.
Foi depois de cumprir o ensino do ciclo preparatório que manifestou o desejo de entrar no Seminário. “Fui fazer exame de admissão no Seminário de Faro, mas reprovei”, conta, lembrando que a justificação seguiu endereçada ao prior de Silves com a inusitada indicação de «incapacidade intelectual». Conhecendo o seu desejo de ser padre, o então pároco de Alcantarilha e Porches não se conformou e intercedeu junto do amigo padre José Felício, da Congregação do Espírito Santo (espiritanos), e o pequeno José Águas seguiu com 12 anos para o Seminário de Viana do Castelo. “Lembro-me, na estação de Silves, ao acenar que as lágrimas corriam pela cara da minha mãe”, relata, explicando que fez a viagem de comboio até Lisboa com uns tios que regressavam à capital e, de Lisboa até ao Porto, sozinho, tendo sido recolhido na cidade invicta por um outro tio que o levou depois a Viana do Castelo.
Esteve dois anos no Seminário de Viana do Castelo, seguiu depois para o de Braga, onde frequentou até ao antigo sétimo ano de escolaridade (atual 11º ano), e continuou para o Seminário da Torre d’Aguilha para completar os estudos de Filosofia e Teologia. Um dia, na Missa em Silves, o bispo do Algarve da altura, D. Francisco Rendeiro – confrontado pelo então pároco, padre José dos Santos Oliveira, com a dificuldade de ingresso no Seminário de Faro – pergunta-lhe se não gostaria de passar a ser seminarista da diocese algarvia. Na altura, a resposta foi negativa, mas em 1965, com a chegada de D. Júlio Tavares Rebimbas à diocese, a transferência acabou mesmo por ocorrer, aproveitando que tinha acabado a formação em Filosofia no Seminário espiritano e feito os primeiros votos na Congregação do Espírito Santo, à qual pertenceu durante sete anos.
Já não chegou a frequentar o Seminário de São José de Faro, seguindo diretamente com os restantes seminaristas algarvios para o Seminário dos Olivais, em Lisboa, onde completou a formação em Teologia durante quatro anos. Foi colega do cónego José Pedro Martins, que acabou por ser ordenado sacerdote dois anos antes, e esteve um ano a estagiar na paróquia algarvia de Martim Longo. Aproveitou esse ano para se formar em História na Faculdade de Letras da Universidade em Lisboa.
Foi ordenado diácono por D. Júlio Tavares Rebimbas e presbítero por D. Florentino Andrade e Silva na Sé de Silves a 29 de outubro de 1972 por ser o primeiro domingo da Semana do Seminário. Entrou no Seminário de Faro ainda antes de ser ordenado padre, como membro da equipa formadora com o padre João Sustelo. Na instituição foi professor de Latim e de outras disciplinas. Por se ter formado também em Filologia Clássica, em Silves chegou também a lecionar Francês, Português e Literatura na Escola Secundária, para além de Filosofia por haver falta de professor da disciplina.
Por D. Florentino Andrade e Silva, a 3 de outubro de 1973, foi nomeado pároco do Algoz, que já incluía a comunidade de Tunes, às quais juntou a 3 de outubro de 1977 a paróquia da Guia por nomeação de D. Ernesto Gonçalves Costa. No Algoz também fez sempre parte da direção da escola, tendo lecionado Português e a então disciplina de Religião e Moral. Ainda jovem, o padre José Águas aproveitava os sábados para vestir o equipamento e praticar desporto. “Ia correr até a Guia ou até Pêra e voltava. Sempre fui desportista”, recorda.
A 6 de agosto de 1983, D. Ernesto Costa nomeou-o pároco da matriz de Portimão, serviço que desempenhou até 2003, ano em que foi nomeado pároco das paróquias de Alferce, Marmelete e Monchique. Ainda como pároco da matriz de Portimão foi nomeado a 7 de maio de 1991 administrador paroquial de Lagos e a 13 de setembro daquele ano pároco solidário (moderador) de Aljezur e Odeceixe, juntamente com o padre Manuel de Almeida Condeço, serviços que assumiu temporariamente. Em Portimão deixou de dar aulas.
Tendo-se especializado em Direito Canónico na Universidade Católica Portuguesa, trabalhou nos tribunais eclesiásticos diocesano e interdiocesano de Évora, Beja e Algarve na defesa das causas para declaração de nulidade de matrimónios. Formou-se igualmente naquela universidade em Liturgia, uma das suas paixões, e em 1986 foi nomeado membro do Secretariado Diocesano de Liturgia, Música e Arte Sacra. “Vivi e senti verdadeiramente a reforma litúrgica, de tal modo que eu, o padre José Pedro [Martins] e o cónego Gilberto [Santos] formámos o primeiro núcleo do Secretariado Diocesano de Liturgia”, testemunhou.
Em 1989 foi nomeado o coordenador daquele organismo, “especificamente, do Departamento de Arte Sacra e Espaços Litúrgicos”. “Organizava todos os anos na Casa de Retiros de São Lourenço [do Palmeiral] um encontro diocesano de liturgia, de sexta até domingo ao fim do dia. Trouxe cá o padre José Ferreira, o cónego Ferreira dos Santos, o padre Leão Cordeiro, o padre Pedro Ferreira. Estive muitos anos nesse departamento e dediquei-me muito à liturgia e, sobretudo, à reforma litúrgica na diocese”, lembra, recordando também as participações nos encontros de Pastoral Litúrgica em Fátima.
Nas paróquias de Alferce, Marmelete e Monchique serviu até 2016. Na altura, a saúde debilitada acabou por obrigá-lo a pedir ao bispo diocesano para deixar a extensa serra. As dores culminaram este ano com a artroplastia da anca a que foi submetido, cirurgia através foi possível fazer a resseção da cabeça femoral e da cartilagem para permitir a sua substituição por uma prótese metálica. Em 2016, regressou então às paróquias de Algoz e Guia, tendo sido nomeado pároco por D. Manuel Quintas, onde ainda se mantém. “Pensava que vinha por um ou dois anos”, refere, acrescentando que nunca pensou chegar aos 50 anos de sacerdócio.
Deste meio século de vida sacerdotal diz guardar “boas memórias e algumas tristezas também”. Um dos marcos no seu ministério foi a humildade do pai ao lhe pedir que o confessasse. “Deu-me um nó na garganta”, conta, acrescentando que o pai faleceu subitamente no dia seguinte. O sacerdote entende ter sido uma “premonição”. “Para mim foi um sinal”, contou emocionado.
Alegra-se por, “mesmo custando”, nunca ter dito que não aos bispos com que trabalhou. Tendo chegado a ser assistente regional do Corpo Nacional de Escutas, segundo nomeação de 8 de março de 1991, o padre José Águas foi ainda, durante vários anos, vigário da vara de Portimão e membro do Conselho Presbiteral da Diocese do Algarve.
No próximo sábado, as bodas de ouro sacerdotais do padre José Manuel Fernandes Águas serão assinaladas na eucaristia das 16h na igreja matriz do Algoz.