
O papa Francisco lembrou esta noite em Fátima os “desterrados” e “excluídos” da sociedade contemporânea, na sua segunda intervenção da viagem a Portugal, na Capelinha das Aparições.
“Sobre cada um dos deserdados e infelizes a quem roubaram o presente, dos excluídos e abandonados a quem negam o futuro, dos órfãos e injustiçados a quem não se permite ter um passado, desça a bênção de Deus encarnado em Jesus Cristo”, disse na cerimónia da Bênção das Velas e na Oração do Terço, à qual presidiu no santuário, depois de ter saudado as centenas de milhares de peregrinos presentes num percurso em papamóvel.
O papa argentino percorreu inclusivamente os últimos metros a pé, até à capelinha das Aparições, e dirigiu depois a palavra a todos os presentes.
Após ter rezado em silêncio da imagem de Nossa Senhora de Fátima, Francisco recordou a orações pelos que “mais precisarem” que é habitualmente recitada na Cova da Iria.
“Que ela, Mãe doce e solícita de todos os necessitados, lhes obtenha a bênção do Senhor”, acrescentou.
Francisco afirmou que a Virgem Maria deve ser vista como uma referência para a vida espiritual dos católicos e não como uma “santinha”.
O papa questionou os peregrinos reunidos na Cova da Iria sobre a imagem que têm de Nossa Senhora: “A ‘bendita por ter acreditado’ sempre e em todas as circunstâncias nas palavras divinas, ou então uma ‘santinha’ a quem se recorre para obter favores a baixo preço?”.
Francisco sublinhou a importância da recitação do terço e convidou os peregrinos a ver na Virgem Maria uma “mestra da vida espiritual”, ou seja “a primeira que seguiu Cristo pelo caminho estreito da cruz” e não “uma Senhora inatingível e, consequentemente, inimitável”.
Francisco apresentou uma reflexão sobre a figura da Virgem Maria, “que deu um rosto humano ao Filho do eterno Pai”.
“Na verdade, se queremos ser cristãos, devemos ser marianos”, afirmou, citando uma intervenção de Paulo VI.
O papa rejeitou “sensibilidades” na Igreja Católica que apresentam Nossa Senhora “segurando o braço justiceiro de Deus pronto a castigar”.

Francisco defendeu também uma “revolução” centrada na misericórdia e no perdão.
“Possamos, com Maria, ser sinal e sacramento de misericórdia de Deus, que perdoa sempre, perdoa tudo”, disse.
Francisco retomou uma passagem da sua exortação apostólica ‘A Alegria do Evangelho’ para pedir aos peregrinos que acreditem “na força revolucionária da ternura e do carinho”.
“Nela [Virgem Maria] vemos que a humildade e a ternura não são virtudes dos fracos, mas dos fortes, que não precisam de maltratar os outros para se sentirem importantes”, precisou.
O papa ficou em silêncio, junto da imagem, antes de acender uma vela, tal como a multidão reunida em Fátima.
A intervenção, em português, usou um tom muito pessoal, com o papa a rezar na primeira pessoa.
“A misericórdia, que usastes para com todos os vossos santos e com todo o vosso povo fiel, também chegou a mim. Pelo orgulho do meu coração, vivi distraído atrás das minhas ambições e interesses, mas não ocupei nenhum trono, Senhor!”, disse.
“A única possibilidade de exaltação que tenho é que a Vossa Mãe me pegue ao colo, me cubra com o seu manto e me ponha junto do Vosso coração”, acrescentou.
O papa apresentou uma reflexão sobre os temas da justiça e da misericórdia, considerando que é necessário valorizar mais a misericórdia divina no discurso católico.
“Devemos antepor a misericórdia ao julgamento e em todo o caso o julgamento de Deus será sempre feito à luz da sua misericórdia”, sustentou.
A intervenção deixou um apelo direto aos peregrinos reunidos para as celebrações do 13 de maio, no centenário das aparições de Fátima: “Na fé que nos une a Jesus Cristo, ficamos livres dos nossos pecados; ponhamos de lado qualquer forma de medo e de temor, porque não se coaduna em que é amado”.

Após a oração do terço, o papa segue para a Casa de Nossa do Carmo, onde fica hospedado em Portugal, até este sábado.
Na Cova da Iria, os fiéis prosseguem com a procissão de velas e a missa presidida pelo cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano.
com Ecclesia