A crescente onda imigratória na Europa tem gerado uma perceção de insegurança, frequentemente explorada por discursos que a associam a uma ameaça à democracia e ao estilo de vida europeu e cristão. Esta perceção, contudo, requer uma análise mais profunda, pois baseia-se em preconceitos, que simplificam a complexidade do fenómeno migratório e ignoram os princípios fundamentais, precisamente da democracia e do cristianismo.

A Igreja Católica, através do Concílio Vaticano II, defende a separação entre Igreja e Estado e promove a colaboração entre diferentes comunidades e nações. A própria natureza universal da Igreja coloca-a como um elemento de união, capaz de superar conflitos e promover a justiça e a caridade entre os povos (GS 42). Essa perspetiva alinha-se com os valores democráticos de inclusão e respeito pela diversidade, contrariando a narrativa que associa a imigração a uma ameaça aos valores cristãos.

É importante a participação política, garantindo o respeito pelas minorias e a colaboração entre cidadãos de diferentes crenças e opiniões (GS 72). Esses princípios são a base de uma sociedade democrática e justa e aplicam-se a todos os indivíduos, independentemente de sua origem. A imigração, nesse contexto, não representa uma ameaça, mas sim, um desafio à capacidade da sociedade de integrar e incluir novos membros, enriquecendo-se com a diversidade cultural.

A ideia de que a imigração pode destruir o estilo de vida europeu e cristão ignora a própria história da Europa, marcada por constantes migrações e intercâmbios culturais. A identidade europeia e cristã, longe de ser monolítica, evoluiu ao longo dos séculos, incorporando influências diversas. A presença de imigrantes, portanto, não é uma novidade, mas sim parte integrante da história e da formação da identidade deste continente.

É inegável que a chegada de um grande número de imigrantes possa gerar desafios, como a pressão sobre os serviços públicos e as mudanças culturais. No entanto, esses desafios não justificam a associação simplista entre imigração e insegurança. Deve existir uma cooperação entre todos, que se traduza em políticas públicas, promotoras da integração dos imigrantes, o diálogo intercultural e a coesão social. Investir em educação, habitação, saúde e segurança pública são medidas essenciais para garantir que todos os membros da sociedade, independentemente de sua origem, se sintam seguros e incluídos.

A perceção de insegurança ligada à imigração, muitas vezes, alimenta-se de medos e ansiedades legítimos, mas que são instrumentalizados por discursos de ódio e desinformação. É fundamental combater essas narrativas, promovendo um debate público baseado em factos e evidências, que reconheça as contribuições positivas dos imigrantes e desmistifique preconceitos infundados. Em vez de ver a imigração como uma ameaça, devemos encará-la como uma oportunidade para construir uma sociedade mais justa, próspera e inclusiva. A diversidade cultural, quando bem gerida, pode ser um motor de crescimento económico, inovação e desenvolvimento social.

A verdadeira ameaça à democracia e aos valores cristãos não reside na imigração, mas, sim, na intolerância, no preconceito e na incapacidade de construirmos uma sociedade baseada na justiça, na solidariedade e no respeito pela dignidade humana. É por isso que prefiro políticos e forças políticas que se afirmam equidistantes da Igreja, mas defendem os mesmos valores cristãos, do que políticos e forças políticas que, afirmando-se cristãos, defendem tudo que é contrário aos valores que são próprios dos ensinamentos de Cristo Jesus. Aliás, limitam-se a usar a capa cristã para atingir os seus objetivos políticos. Só fazem mal à Igreja, usando-a para os seus fins e, também, à sociedade, porque a fragmentam.