No encontro das instituições particulares de solidariedade social (IPSS) da Igreja que se reuniram ontem no Centro Pastoral de Ferragudo, o diácono Luís Galante apresentou uma reflexão sobre a carta apostólica do Papa Bento XVI ‘Intima Ecclesiae Natura’ (A natureza íntima da Igreja), de 11 de novembro de 2012, sobre o serviço da caridade.

“Nos nossos estatutos, aparece logo no preâmbulo, a menção de que as normas estatutárias na parte canónica são inspiradas na doutrina deste ‘Motu Proprio’ porque ela trata do serviço da caridade e veio colmatar uma lacuna que existia no Código de Direito Canónico relativamente à gestão das instituições sociais da Igreja e a sua ligação aos bispos diocesanos”, considerou aquele responsável, lembrando que a referência àquele documento foi incluída na reforma de 2014.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Luís Galante recordou que “o serviço da caridade é uma dimensão constitutiva da missão da Igreja” e da sua “natureza íntima”. “Como agentes da pastoral social devemos ter presente que estamos a cumprir a missão da Igreja na sua vertente da caridade”, destacou, aconselhando as IPSS a terem presente “a dimensão de também cuidar da alma”.

O orador realçou que “nas Igrejas particulares cabe aos bispos, enquanto sucessores dos apóstolos, a primeira responsabilidade pela realização da caridade” e compete-lhes uma “posição de autoridade e coordenação” naquelas instituições. “Somos como colaboradores do bispo no exercício dessa missão. Porém, o Papa Bento XVI constatou que o Código do Direito Canónico não tratava explicitamente da caridade no âmbito específico da caridade episcopal. Permanecia uma lacuna normativa no Código do Direito Canónico para evidenciar o serviço da caridade na Igreja e a sua relação com o ministério episcopal”, prosseguiu.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

O diácono referiu ainda que “compete ao bispo diocesano vigiar para que, na atividade e gestão destes organismos, sejam observadas as normas do direito universal e particular da Igreja”. “Ao bispo compete a vigilância sobre os bens eclesiásticos dos organismos caritativos”, acrescentou, explicando que o bispo deve ainda cuidar “que a gestão das iniciativas que dele dependem dê testemunho de sobriedade cristã” e que há mesmo a “obrigação de entregar anualmente ao bispo diocesano o relatório de contas”.

Luís Galante explicou que o ‘Motu Proprio’ do falecido Papa explicita que “na sua atividade caritativa, as organizações católicas não se devem limitar a uma mera recolha com distribuição de fundos, mas dedicar uma especial atenção à pessoa necessitada”. “A atividade caritativa da Igreja, nos seus diversos níveis, deve evitar o risco de se diluir na pura organização assistencial e se tornar numa simples variante da mesma. É um risco que corremos em função dos acordos que temos, ficarmos todos muito fidelizados àqueles encargos que decorrem dos acordos de cooperação e de outras normas regulamentares”, alertou.

Aquele responsável lembrou que “as dioceses devem respeitar a autonomia de governo das instituições, principalmente aquelas que têm uma base de caráter mais associativo como são claramente as Misericórdias”. “Mas isso não obsta a que o bispo diocesano seja vigilante para garantir que a gestão das instituições sociais da Igreja se realiza em conformidade com a doutrina da Igreja, segundo as intenções dos fiéis que estiveram na origem das instituições e respeitem as normas legítimas estabelecidas pela autoridade civil”, acrescentou.

Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

Luís Galante advertiu que aquelas empresas do terceiro setor devem “seguir na sua atividade os princípios católicos e não podem aceitar compromissos que de alguma forma condicionem a observância destes princípios”, tendo referido concretamente as questões relacionadas com o aborto e a eutanásia, lembrando àqueles dirigentes o “direito a invocar a objeção de consciência” “em termos pessoais e institucionais”. “Em termos institucionais não podemos criar ambiguidades nem equívocos. As pessoas têm de saber qual é a doutrina da Igreja Católica”, sustentou.

O orador aconselhou ainda a “evitar a multiplicação das iniciativas de serviço da caridade em detrimento da operacionalidade e eficácia” e ao “cuidado de gerir as nossas instituições com critérios de rigor, de uma certa parcimónia”.