
Por estes dias, assaz preenchidos e cansativos, há uma ideia que me tem acompanhado, a propósito de um tema da atualidade, a fuga de Pedro Dias, o homem que assassinou duas pessoas e feriu outras três: como é que se encontra alguém que não quer ser encontrado?
No caso de uma investigação policial haverá, por certo, diversas técnicas, muitas mesmo, para poder reconhecer pistas e indícios, para definir certezas e estratégias de atuação. Não será fácil para os investigadores que estão no terreno, dedicando-se inteiramente a este caso, definir um caminho a seguir, quando o homem que pretendem encontrar parece ter um conhecimento muito forte do local por onde anda. E, quem sabe, conta com alguma(s) cumplicidade(s). Será ainda mais difícil para os polícias agir, com os olhos da opinião pública abertos pelo trabalho da imprensa, sempre a escrutinar todos os passos que se dão.
O que se passa no interior destas equipas de trabalho é um mistério, certamente comparável aos melhores policiais que vemos na televisão, no cinema e nos livros do género, mas não obstante um mistério para nós, que não temos acesso a tudo e, nem devemos ter, já que toda a informação passará, igualmente, para o homicida, que estará a estudar a forma de melhor se proteger e de, lá está, não ser encontrado.
No entanto, o mistério é semelhante ao que vivemos todos nós em determinados momentos das nossas vidas, nos quais, por escolha ou por imposição dos acontecimentos, tudo fazemos para não sermos encontrados. Há horas em que gostaríamos – e usamos muitas vezes a expressão – de desaparecer! Este desaparecer era precisamente o não lidar com situações, pessoas, gestos, atitudes que não gostamos, que pensámos não serem possíveis, que nos fazem querer ficar enroladinhos na nossa concha e não mais sair dela. É não querermos estar expostos ao olhar do mundo e desejar ardentemente que possamos traçar caminhos de maior solidão ou com cumplicidades que nos ajudem a reforçar as nossas convicções mais íntimas e arreigadas.
E se há esta vertente virada para o mundo exterior, o desaparecer também teria uma dimensão interior, ou seja, o não lidarmos com as nossas próprias emoções e pensamentos, de modo a que não nos ferissem, não nos perturbassem e não nos fizessem sentir a necessidade de recalibrar todo o nosso sistema… Sabemos onde estamos, nessa hora. Sabemos que precisamos de nos renovar emocional e psicologicamente, mas não nos queremos encontrar, pois é mais fácil apenas não fazer nada, existir, permanecer em fuga, sendo cúmplices da nossa fragilidade humana e olhando para tudo e para todos com total desconfiança.
Encontrar quem não quer ser encontrado é tarefa difícil. Mas quem procura tem uma missão grandiosa: devolver a justiça e o equilíbrio ao mundo em que vivemos, quer procure um homicida em fuga, quer procure o nosso verdadeiro eu e nos ajude a redescobri-lo. Bem haja quem tem tal missão.