Teodomiro_neto
por Teodomiro Neto

Ao Advogado, Dr. António Brás

FARO foi, no Algarve, a cidade pioneira dos Compromissos Marítimos, cuja primeira Associação foi iniciada no ano de 1392 (séc. XIV), segundo o historiador Alberto Iria, in (O Algarve nos Descobrimentos, página 23).

Compromisso é uma das formas empregadas para fazer uma eleição e dá-se quando os eleitores unânimemente transferem o direito de eleger para um ou mais indivíduos, em nome de todos. Assim, nessa unidade, se criaram os Compromissos Marítimos por todo o Algarve. Temos o estudo de três Compromissos Marítimos: Faro, Tavira e Olhão.

Seguindo o historiador Alberto Iria, agora nas “Cortes Medievais Portuguesas do século XV, vem a informação (página 113): “Que Faro era a o principal porto do Algarve, passagem obrigatória de desembarque e embarque, e terra de aposentaria habitual, dos que íam e vinham de Ceuta e, sobretudo do Mediterrâneo para Norte da Europa e vice-versa (…) Faro era uma cidade “sollaçosa e viçosa”.

Já Faro construíra o seu primeiro hospital (século XIV), situado no campo da Trindade, para apoio aos militares portugueses feridos da guerra entre corsários. Lembramos que a frota portuguesa, para a conquista de Ceuta (a primeira aventura portuguesa em expansão), esteve aboletada em Faro, durante uma semana, por razões de ventos contrários, partindo de Faaron, a 15 de Agosto de 1415, servindo o hospital de Faro para socorro dos sinistrados de Ceuta. No início do século XVI (1501), fora construído o novo hospital, no espaço que viria a ser anexado à Misericórdia, Praça das Rainhas, junto à citada igreja da Misericórdia, como se encontra na actual Praça D. Francisco Gomes de Avelar, que duraria em serviço, cerca de até finais do século XX, durante cerca de 500 anos.

Segundo a “Corografia Económica do Reino do Algarve, de João Baptista da Silva Lopes, página 103, 1.º volume cita: “No Algarve formaram-se Associações com o nome de Compromisso, para cujos fundos todos concorrem com parte dos seus lucros, quer seja de pesca, quer sejam de viagem. O mestre é obrigado a separar, quando faz contas à companha e entregá-los à mesa. Compõe-se a mesa de sete mareantes, sendo um deles juiz, outro escrivão, outro tesoureiro e outros quatro eleitos votados todos os anos. Fornece o Compromisso às famílias dos marítimos: médico, cirurgião, sangrador, botica (farmácia) e socorros pecuniários, quando estão doentes, velhos ou pobres, o que é muito comum, porque o pescador nunca olha para o dia de amanhã”.

Caderneta de sócio da Casa dos pescadores-Faro: João Carlos Júnior - 1946 - Quota mensal 4$00
Caderneta de sócio da Casa dos pescadores-Faro: João Carlos Júnior – 1946 – Quota mensal 4$00

O Compromisso Marítimo de Faro (Confraria do Bom Jesus dos Mareantes), com edifício próprio, inicialmente construído no final do século XIV, passou pelas vicissitudes dos tempos, sendo reconstruído, no início do século XVIII (1709), no seu lugar próprio, no bairro de S. Pedro (o sempre bairro dos pescadores), com lateral na antiga rua do Zambujeiro (actual rua do Compromisso). A frente do Compromisso situa-se na rua de S. Pedro, edifício de formulário da arquitectura Chã, mostrando, num nicho a imagem do padroeiro, S. Pedro Gonçalves Telmo. Sempre os mareantes de Faro tiveram a igreja de S. Pedro, na devoção na capela de Nossa Senhora da Vitória, pertencente à Corporação do Corpo Santo (Compromisso Marítimo): capela que vem designada desde 1758. Era esta classe de marítimos protegida pelos poderes, pela sua importância social e económica.

OLHÃO, a antiga freguesia de Faro, leva a constituir-se independente dos mareantes da cidade concelhia. Assim cria o seu próprio Compromisso, a partir de 1756, por Alvará Régio de 6 de Julho, ficando assim os mareantes de Olhão, a seu pedido, desligados da Confraria do Corpo Santo ou Compromisso Marítimo de Faro (“Opúsculos Históricos Sobre Olhão” de Antero Nobre, página 20- Edição C.M.O.-2008.

As regras do Compromisso criado em Olhão, por decreto do rei D. José I, em 1771. Consiste o documento real: “Eu el-Rei faço saber que os mareantes de Olhão, que dista da cidade de Faro mais de uma légua, Me representaram por sua petição que sendo aquele lugar no seu princípio fundado com poucos pescadores (…) se separem da Casa do Compromisso da Confraria do Corpo Santo da cidade de Faro”. Os sentimentos do povo de Olhão foram os mesmos das citadas confrarias: defesa e protecção aos mareantes e suas famílias. A escritura pública notarial foi realizada num dos Tabeliães de Notas de Faro, no dia 17 de Novembro de 1768. O edifício do Compromisso de Olhão ficou concluído, três anos após a carta régia. Hoje o edifício do Compromisso de Olhão, construção feita à custa dos mareantes da Nobre Casa do Corpo Santo, está transformada em Museu Municipal.

TAVIRA tem o seu Compromisso desde o início do século XVI, iniciado pelo reinado de D. Manuel I, grande protector da vila que elevou a cidade a 16/03/1520.

No apêndice doc. Nº 1 revela-se a certidão: Mareantes da cidade de Tavira e confrades da Confraria do Espírito Santo da mesma cidade (…) que pelos senhores Reis passados lhe foram concedidos dos quais lhes passarão novas cartas assinadas por V. Majestade.

A ligação do Compromisso Marítimo de Tavira ao poder Real, tem a sua confirmação pelos alvarás e privilégios que os reis concediam a esta Corporação.

O Compromisso Marítimo de Tavira tem um carácter religioso, dado que teve desde a sua fundação a ligação à sua Igreja, chamada, na voz do povo, de Igreja das Ondas. No primeiro capítulo do Apêndice Doc. 2.º, regista: Que a nossa igreja, a Casa de Deus onde se louva o mesmo Senhor, e ao glorioso S. Pedro Gonçalves Telmo, nosso patrono e Padroeiro.

O Compromisso Marítimo de Tavira, à semelhança das associações congéneres, regia-se por estatutos que definiam com rigor as regras que deveriam ser observadas pelos seus associados.

Após a Revolução Liberal, por portaria do Ministério do Reino, datada de 5 de Outubro de 1838, foram aprovados novos estatutos da Corporação Marítima com 65 artigos, e a determinação de que a cargo do Compromisso ficaria o reparo e a conservação da Igreja de São Pedro Gonçalves Telmo (Igreja das Ondas), o santo padroeiro em honra do qual faziam festa.

A 13 de Março de 1851 há registos de nova mudança de estatutos pela necessidade de reformação de algumas disposições impraticáveis e também porque opostas ao sistema de legislação constitucional. Sobre estas Associações corporativas, os antigos Compromissos Marítimos foram substituídos pelas Casas dos Pescadores, criadas pelo Estado Corporativo, e reguladas pela lei n.º 1953 de 11 de Março de 1937.

Na actualidade, após o 25 de Abril de 1974, as Casas dos Pescadores (antigos Compromissos Marítimos), encontram-se extintas, e a missão que estas cumpriam, na prestação de cuidados de saúde e assistência social aos seus associados, passou a ser assegurada a nível nacional pelo Serviço Nacional de Saúde e de Segurança Nacional, de que são beneficiados todos os trabalhadores portugueses. O edifício do antigo Compromisso/Casa dos Pescadores de Faro é, hoje, propriedade do Estado.