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Foto © Samuel Mendonça/Folha do Domingo

A edição deste mês dos “Encontros no Silêncio” que a comunidade algarvia das Carmelitas Descalças está a promover desde novembro ficou marcada pelo testemunho vocacional de três consagrados da Diocese do Algarve.

O encontro do passado dia 3 de Fevereiro, que teve lugar no Carmelo de Nossa Senhora Rainha do Mundo, no Patacão (localidade limítrofe de Faro), teve então um caráter mais testemunhal por ocorrer ainda no contexto do Dia do Consagrado que a Igreja celebrou na véspera.

Aos cerca de 40 jovens presentes, não apenas daquela comunidade de São Paulo, mas também das paróquias de São Pedro de Faro, das Ferreiras, de Ferragudo e da “Pequena Fraternidade Provisória” de Taizé, os três vocacionados foram unânimes em destacar a importância da oração no seu discernimento vocacional.

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O padre António de Freitas começou por contar que a atração pelo sacerdócio veio no contacto com o seu pároco, acrescentando ter sido já no tempo de catequese que começou a colocar “mais a sério” a possibilidade de ir para o Seminário.

O sacerdote da Diocese do Algarve lembrou que, após a entrada na instituição, o “momento mais decisivo” da sua vida aconteceu quando decidiu sair. “Saio do Seminário porque tinha dúvidas. A grande dúvida era se era capaz de levar isto até ao fim, porque só podia assumir este serviço se tivesse consciência de que era para a vida toda”, contou, lembrando que o afastamento de Deus, da oração e da vida da comunidade, começam a fazer sentir-se “vazio, sem sentido”. “Aquela saída que, aparentemente, me abriria as portas da liberdade para fazer o que queria, faz-me sentir sem sentido”, evidenciou.

O padre António de Freitas contou então ter sido o regresso à oração, diante do Santíssimo Sacramento, e o “desejo de estar próximo de Deus” que o levou à resposta para a sua vida. “Quando mais quis fugir de Deus, foi quando Deus se fez mais próximo de mim. Respeitou sempre a minha liberdade, mas fez-se próximo para perceber que me continuava a amar e a querer mesmo como eu era”, sustentou, destacando a importância da oração no processo de discernimento vocacional. “Às vezes é difícil parar para rezar, mas sem estes momentos a nossa vida pode falhar na descoberta daquilo que Deus quer para nós e na descoberta daquilo que nós somos”, advertiu, pedindo aos jovens que “estejam sempre atentos aos sinais” de Deus e que não se esqueçam de rezar.

Em resposta a uma questão sobre o celibato, o sacerdote disse ainda que o mesmo “é uma questão opcional” que “só pode ser compreendido como uma questão de amor”. “O celibato, às vezes, mais do que incomodar os celibatários, incomoda o mundo porque é um sinal de um modo diferente de amar”, completou.

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A irmã Vera, das Missionárias da Caridade (popularmente conhecidas como irmãs da caridade, irmãs de Calcutá ou irmãs Teresa de Calcutá), contou que durante “uma espécie de crise de fé” iniciou “um tempo de muita luta interior”. “Sabia que Deus amava a todos, mas eu queria saber que Ele me amava a mim”, testemunhou.

“Nunca pensei em ser freira. Era a última coisa que eu queria”, contou a religiosa, lembrando que uma carta de uma amiga sobre Maria, o encontro com o papa João Paulo II no Parque Eduardo VII e a vida de Madre Teresa da Calcutá a foram progressivamente ajudando a discernir a vocação. No entanto, foi um encontro com uma presença “desprezada por todos” os passantes que a fez entender o caminho a seguir. “Naquele momento Jesus manifestou-se na beleza daquela senhora que estava ali. Saí da estação do Rossio quase aos pulos de alegria porque encontrei Jesus. Então aí não houve mais dúvidas de que era assim que eu ia amar e servir Jesus a minha vida toda”, relatou, lembrando ter sido uma novena de oração, após a qual percebeu que Deus a deixava “completamente livre” para fazer outro caminho se assim entendesse, que a levou a decidir-se definitivamente pela vida consagrada. “Deus usou várias pessoas para me falar e usou até as minhas fraquezas e fragilidades para se revelar. Deus ia criando certezas dentro de mim à medida que eu ia escutando”, observou.

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A irmã Lurdes, das Carmelitas Descalças, contou que a visita a uma tia carmelita a levou aos 12 anos a querer seguir aquela vocação, apesar de ter tido pretendentes para namorar e de ter chegado a pensar casar e “ter muitos filhos”. Na passagem de um sacerdote missionário pela sua paróquia que falou de Santa Teresinha reforçou a certeza da sua vocação e de querer ser carmelita. “Escrevi para o Carmelo e disseram-me que estavam a fazer aqui uma fundação e que poderia entrar”, contou, explicando que chegou ao Algarve em julho de 1980, com 22 anos, quando ainda as carmelitas viviam na igreja do Carmo.

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“Quando estava a preparar-me e a perceber o que é que Jesus queria de mim costumava a visitar muitas vezes Jesus na eucaristia na igreja. Num dos dias em que fiz essa visita senti no meu coração esta palavra: «eu sou teu amigo»”, contou, testemunhando a “força” e “alegria” de se “dar a toda a humanidade”. “Não já só àqueles filhos que eu desejava quando era mais jovem, mas é toda esta humanidade por quem eu me quero oferecer e me dar cada dia”, sustentou.

A irmã Lúcia Maria concluiu os testemunhos evidenciando que as complementares dimensões contemplativa e ativa estão presentes em todos os institutos religiosos e destacando a importância da solidão. “A solidão que a carmelita ama é a solidão que ajuda a encontrar-me com Deus para estar sempre a fazer aquilo que a Igreja me pede: orar. E, portanto, é uma solidão habitada, não é porque estou aborrecida e me vou refugiar. Não é um fim, é um instrumento, como o silêncio, que me ajuda a estar recolhida, a lembrar e a voltar ao coração, às intenções que me estão confiadas”, justificou a carmelita.

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O encontro que prosseguiu em ambiente de recolhimento silencioso com momentos de reflexão e oração pessoal, terminou com a celebração da eucaristia, presidida pelo padre António de Freitas, na qual o sacerdote desafiou os jovens a tornarem-se disponíveis para ajudar os outros a ganhar e a descobrir a vida. “Deixem-se amar e conduzir por Jesus”, pediu.

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