
A actualidade desta semana foi marcada por dois acontecimentos, um nacional e outro internacional: por cá, um grupo de alunos da Universidade Nova de Lisboa entendeu que era um ato legítimo e democrático fazer o que podia para impedir que um cidadão deste país – no caso, era Jaime Nogueira Pinto, conhecido politólogo e professor catedrático – pudesse proferir uma comunicação num evento que deveria ter lugar nas instalações da Universidade. Alegavam, esses jovens estudantes de esquerda, na ata da reunião geral de alunos (mas que afinal tinha pouco mais de 25 participantes…), que o evento estaria «associado a argumentos colonialistas, racistas, xenófobos que entram em colisão com o programa para o qual a AEFCSH foi eleita, além de entrar em colisão com a mais básica democraticidade e inclusividade». Fantástico! Democraticidade e inclusividade! Os princípios que se defendem, mas que afinal de nada servem no momento de decidir impedir que alguém que não pensa de forma igual a nós possa a falar…
Já a nível internacional, mais precisamente num país que sempre foi visto como progressista e democrático, a Holanda, ministros de origem turca – país maioritariamente muçulmano – são impedidos de entrar para realizarem reuniões e participarem em atividades públicas, junto da comunidade de imigrantes, ações que terão uma relação direta com o referendo que em breve haverá nesse país. Trocadas acusações e palavreado vazio e ofensivo entre políticos de ambos as nações – porque neste jogo das palavras ninguém fica atrás de ninguém -, resta a certeza que o próximo primeiro-ministro holandês será um radical de direita ou um quase radical de direita, sendo que ambos defendem este gesto, bem como a “desislamização” da Europa, o encerramento de mesquitas e outras medidas que redundam numa só ideia: todos os muçulmanos são, aos olhos destas pessoas, terroristas e párias, logo, não terão direitos, nem espaço nas sociedades em que imperar tal visão.
Parecemos estar perante um jogo daqueles em que temos de encontrar as diferenças entre dois desenhos… Onde estarão elas? Existem mesmo?…
Cada um de nós, ao nascer, mesmo que tenha vários irmãos – eu, por exemplo, tenho dois –, tem características singulares: olhos de cor diferente, pele de cor diferente, cabelo de cor diferente, género diferente. Ao longo da vida e como resultado do meio em que crescemos, da educação que recebemos, do país a que pertencemos e da religião em que acreditamos (para não mencionar outras coisas), desenvolvemos características ainda mais distintivas. Não somos iguais, ainda que possamos aproximarmo-nos de alguma forma de pensar ou de algum grupo ou pessoa, porque temos preferências idênticas. Mas essa proximidade não impede, por certo, que reconheçamos nos outros (aqueles que não pensam da mesma forma que nós, que não cresceram no mesmo país que nós e não foram educados, nem acreditam no mesmo que nós) o direito de terem o seu espaço e de se poderem manifestar e dizer de sua justiça!
Se esse direito básico à diferença e à manifestação da mesma, mais ainda, à manifestação da opinião e expressão do pensamento não existissem, este país que tanto se orgulha da Revolução dos Cravos permaneceria uma ditadura e a Europa, que tem como obrigação encontrar caminhos de partilha e de fraternidade, estaria na Idade das Trevas, governada por um qualquer Hitlerzinho. No presente olhamos para uma pessoa de direita que é impedida de falar e para muçulmanos que são vistos como ameaças, mas do mesmo modo podemos esperar que a história se repita com cidadãos de esquerda e com cristãos ou budistas. Basta que mudem os interesses e os peões no jogo de quem quer mandar.
As diferenças, aquelas que tentávamos encontrar, resumem-se a uma só questão: uns são extremistas de esquerda e outros são de direita. E, para quem ainda não conseguiu perceber, aqui está a prova provada de que os extremos se tocam…
Procurando auxiliar ainda mais o leitor amigo (como dizia o meu muito admirado Eça de Queiroz), termino citando a Constituição da República Portuguesa, que todos, enquanto cidadãos, temos o dever de respeitar. E desejando que todos procuremos não o equilíbrio, nem os extremos, mas o verdadeiro sentido de justiça e o ponhamos em prática.
Artigo 37.º – Liberdade de expressão e informação
- Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.
- O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura.
Artigo 41.º – Liberdade de consciência, de religião e de culto
- A liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável.
- Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa.