
A assembleia da Diocese do Algarve que serviu para apresentar, na manhã do último sábado, as linhas programáticas para o ano pastoral 2018/2019 que agora começou – o segundo ano do programa pastoral trienal que conduz a Igreja algarvia até 2020 – contou com uma mesa redonda composta por duas apresentações sobre os temas “Os jovens e a Igreja” e “Uma Igreja missionária do lado de cá”.
No âmbito da primeira dimensão teve lugar a intervenção de Tomás Virtuoso, que representou o Secretariado Internacional das Equipas Jovens de Nossa Senhora na reunião pré-sinodal com o papa, realizada em março em Roma, como encontro preparatório para o próximo Sínodo dos Bispos.
Aquele jovem de 24 anos rejeitou que aquela iniciativa sobre ‘Os jovens, a Fé e o Discernimento Vocacional’, que terá lugar no Vaticano entre 3 e 28 de outubro, venha a ser “um momento concreto na história em que a Igreja pára para pensar nos jovens”. Tomás Virtuoso disse que a preparação e realização da assembleia geral ordinária dos bispos reflete mais do que isso e fala numa “mentalidade sinodal de uma Igreja que caminha em conjunto”, “um caminho de Igreja que se faz com os jovens, a partir dos jovens, também para onde eles querem ir” porque eles são “parte integrante da Igreja e não um satélite ao qual a Igreja vai fazendo propostas para os entreter”.

Neste sentido alertou para a importância “fundamental” de “descentralizar” o Sínodo para que este não seja tido como “uma coisa que será em Roma”, mas permita que a “possibilidade de falar e debater estes assuntos possa ser tida paróquia a paróquia, vigararia a vigararia, diocese a diocese, grupo a grupo”.
Tomás Virtuoso explicou que, por via de os problemas dos jovens dos diversos continentes serem “totalmente diferentes”, o Documento Final da Reunião Pré-sinodal representa a “capacidade de valorizar a diferença e o pluralismo, mas sempre sabendo que a unidade é superior”. “Ninguém que ali esteve diria: eu revejo-me em tudo”, afirmou no encontro que reuniu cerca de 460 representantes das paróquias, dos serviços e movimentos da igreja algarvia no salão paroquial de São Pedro do Mar, em Quarteira.
Apontando os “desafios que os jovens nos dias de hoje têm” e as “respostas que a Igreja deve ir dando”, aquele membro do Patriarcado de Lisboa, considerou que “para uma sociedade individualista a resposta é uma Igreja que seja um sinal grande de comunidade”. “Se algum desafio a Igreja tem hoje – tem sempre, mas hoje principalmente nesta sociedade egoísta – é o de formar verdadeiras comunidades. Esta experiência de comunidade, nesta capacidade de me abrir ao outro, que me descentra de mim mesmo e que me diz que eu não posso ser verdadeira pessoa sem os outros, é absolutamente fundamental no mundo de hoje. Se há alguma mensagem profética que a Igreja pode dar ao mundo de hoje é esta importância fundamental da comunidade”, sustentou, lamentando a existência de uma “hiperconexão que se transforma num isolamento” e de uma cultura de “autossuficiência” e “autocentralismo”.

Por isso, destacou a “grande eficácia” em “despertar no jovem a fé” e o “desejo de Deus” de “projetos em que os jovens são postos em comunidade e enviados para fazer missão”.
Por outro lado, Tomás Virtuoso alertou para a “relação pouco saudável que os jovens hoje têm com o tempo” por causa de “uma incapacidade muito grande de lidar de uma forma saudável e equilibrada com o seu passado, de estar bem no seu presente e lidar com tranquilidade e serenidade com o seu futuro”. “Há quase uma esquizofrenia permanente com o tempo: nunca estamos onde estamos, não sabemos viver com a nossa história, com os nossos erros passados e [vivemos] com permanente medo de tudo o que venha aí”, lamentou, criticando a “fragmentação total” que “caracteriza o mundo de hoje” e que disse traduzir-se na “incapacidade de se estar a viver o que se está a viver, de se estar inteiramente com quem se está”.
Lembrando que o documento sinodal inclui um capítulo inteiro à “relação do jovem com o futuro”, defendeu que “a melhor forma de responder a esta incapacidade dos jovens de hoje de lidarem com o tempo é apresentar-lhes, de uma forma renovada, estruturada, apaixonada e alegre, um projeto de santidade” “que consiga dar corpo a um horizonte largo para a sua vida” e que dê “capacidade ao jovem de enfrentar o seu futuro com serenidade e confiança”.
O participante da reunião pré-sinodal acrescentou que os jovens devem “ter uma vontade de santidade, mas partindo da sua identidade”, ou seja, de “perceber que têm uma história, que não a devem esquecer, mas que a devem valorizar nos seus erros, fragilidades, para perceberem o que têm de mudar”.
Tomás Virtuoso disse ainda que a “necessidade de adultos que sejam verdadeiros modelos, não só de fé, mas de vida” é algo comum aos jovens de hoje de todo o mundo e lamentou haver “um défice grande de testemunho, de cristãos que sejam o verdadeiro testemunho de o que uma vida com Jesus pode mudar”. O jovem da paróquia de Carcavelos pediu “muita atenção” à “pastoral da transição”. “Há uma verdadeira incapacidade na Igreja de responder às necessidades do jovem quando ele está em mudança, quando ele está a transitar de um estado para o outro”, disse, referindo-se aos períodos correspondentes à entrada na universidade, à fase de namoro, à etapa do casamento ou à entrada no mercado de trabalho.

“A solução passa por pensarmos numa pastoral verdadeiramente de transição, que consiga ir «agarrar» o jovem onde ele está. É nestes momentos de transição que o jovem mais está à procura de referências, de «terra para pôr as suas raízes». E se a Igreja não tem a capacidade de ser uma resposta presente a estes jovens, outras coisas terão”, acrescentou, exortando à corresponsabilização e acompanhamento dos jovens nos momentos de transição. “Tenho imensas dúvidas que alguém que se sinta responsável, fuja. Muitas vezes queixamo-nos que os jovens fogem porque não somos capazes de os fazer parte das nossas comunidades”, afirmou.
Neste sentido, destacou também a importância de “valorizar cada vez mais, sobretudo ao nível paroquial dos grupos, o acompanhamento espiritual”.
Tomás Virtuoso disse haver nos jovens uma “necessidade da transcendência” e uma “abertura à espiritualidade” “que a Igreja não devia ignorar”, mas “ver quase como profética”. No entanto, ressalvou tratar-se de uma “abertura à espiritualidade que não se converte numa abertura à religiosidade” por existir “uma recusa quase total e absoluta de uma vivência religiosa”. “Quando percebem que esta abertura à transcendência depois tem consequências morais no dia-a-dia, aí as pessoas acanham-se”, lamentou, considerando que os jovens, face à “proposta exigente” recusam “mudar assim tanto a vida” e que não reconhecem na Igreja “um caminho válido”. “Isto tem de nos fazer pensar”, alertou, aludindo a uma “revolução de autenticidade”. “Se há uma coisa de que precisamos é de sermos, cada vez mais, autênticos”, considerou.