– a propósito do tanto que se vive hoje nas nossas escolas
Por vários motivos, tenho falado, por estes dias, em marasmo. Um marasmo circundante, de uma paz fininha e jeitosa, mas podre e bem podre. Um marasmo de viver parado de ação, quase inerte, em piloto automático sem pensar nem mexer muito, para não chatear. E isto porque se está cansado, saturado e maçado, com tanta burocratização imposta. Não dá para mais. Um dia atrás do outro de coisas para fazer e cumprir, de orientações a seguir, de diretrizes a adotar. A nossa escola, como comunidade viva e complexa, tem estado refém de sucessivas e diversas orientações superiores que a transformam depois, numa máquina impiedosa de grelhas e estudos, metas e índices, comparações e percentagens que vão justificar por sua vez, recursos, investimentos, estratégias e opções de funcionar. E depois, baralha-se outra vez, avalia-se e compara-se, projeta-se e define-se, tornando-nos a todos, exímios (mas estafados) executantes, ótimos gestores de reuniões, esplêndidos operacionais, de coisas com as quais (muitas delas…) nem nos identificamos nada. E nesse marasmo dominante, vamos vivendo. E neste marasmo dominante vou perguntando, com o coração apertado muitas vezes, pelo tempo para a relação interpessoal com pares e com alunos, vou perguntando pelos afetos, pelo respeito pela diferença, (tenha ela a forma e cor e tamanho que tiver), pela alegria de estar na escola, pela brincadeira genuína, pelos pares com quem se aprende, pelo orgulho e referência de um ou vários professores, pelos momentos que marcam, pelas vivências únicas, pelo pensamento de respeito por uma COISA (chamada escola) que nos pode (lhes pode, aos alunos também…) dar tanto. Onde está isso? Onde se vê isso? Onde se vive isso e se conta a seguir? Em que projeto? Em que intenção? Em que orientação superior que espelhe e priorize esse sentir? Ficou só no pensamento como uma “coisa-bonita-para-alguns?”Já não há espaço para isso? Fica só no papel? Aquele papel bem feito e eficiente, página de ata ou relatório, que acompanha a tal paz, a podre?
Estou a entrar no meu trigésimo ano de serviço. Sou Educadora de Infância de formação e estou há 8 anos noutro grupo de docência. Trabalho num Agrupamento de Escolas com quase 2000 alunos e tenho muito orgulho nesta profissão que escolhi. Sinto-me gratificada por ainda ter esta inquietação, este desassossego e também por tantos colegas meus se identificarem com esta minha reflexão e por ver em tantas escolas, como na minha, este esforço, este anseio, este desafio de não nos esvaziarmos de conteúdo. Mas é sério, o risco. É real, palpável, constante e próximo. Temos de ter cuidado. Temos de ressignificar. Falar sobre isto. Dar, a essa coisa-chamada-escola, aquilo de que ela precisa mesmo: pessoas, afeto, intenção e tempo. As primeiras compõem, o segundo une e dá sentido, a terceira objetiviza, planifica no tempo, no espaço e nas mentes e o último… ah, o último deixa saborear. E saboreando, a vida é muito melhor. E a escola também, acho!!