O vigário geral da Diocese do Algarve exortou esta noite, na Procissão do Enterro do Senhor em Faro, os cristãos algarvios a não terem medo de defender a sua fé.
O cónego Carlos César Chantre, que realizou, a pedido do bispo do Algarve, o sermão que antecedeu a popularmente conhecida como Procissão do Senhor Morto, pediu que, “no meio de uma Europa que tem dificuldades em acreditar em si mesma, ao menos que os cristãos digam abertamente, pela sua vida pessoal e familiar, que acreditam em Jesus Cristo”.
“Não tenhamos medo de defender a nossa fé, a fé que os nossos avós nos transmitiram porque quando um povo perde a sua identidade, outros povos ocuparão essa identidade. Todas as vezes que um povo se demitiu da sua cultura, outras culturas ocuparam o seu lugar”, alertou junto à igreja da Misericórdia, ressalvando, não obstante, que “todas culturas são bem-vindas porque todas as culturas proveem do Criador”. “Demitirmo-nos da nossa para que as outras existam, isso é que não pode ser. Tem que ser a nossa mais as outras e as outras mais a nossa. E a nossa tem um fator comum em evidência: Jesus Cristo”, sustentou.
O sacerdote lamentou o “quão difícil é falar de Jesus Cristo nos areópagos na Europa”. “Não acontece nem na Ásia, nem na África. Mas na Europa está a acontecer. Talvez por cansaço cultural e intelectual”, constatou, considerando que a solução poderá vir das “aldeias” e “pequenas cidades da Europa que podem fazer a diferença”. “E a cidade de Faro pode fazer a diferença”, desejou, defendendo ser preciso trazer novamente para as cidades a “obra-prima da criação” que é a pessoa. “Não podemos permitir que esta obra-prima da criação seja desviada, deturpada, injustamente tratada”, acrescentou.
Perante alguns milhares de pessoas, incluindo também transeuntes, mirones e curiosos que, uma vez mais, acorreram à igreja da Misericórdia, em plena baixa da capital algarvia, o cónego César Chantre disse esperar “que todos os responsáveis do país não se esqueçam que o primeiro património é o ser humano, a sua espiritualidade”. “E a cultura dos portugueses baseia-se em Jesus Cristo”, evidenciou, afirmando ser por isso mesmo que “recebe todas as outras culturas em igualdade de circunstâncias de tratamento”.
O vigário geral lembrou que Jesus “quis a igualdade entre o ser humano” e “nunca acusou ninguém, mas perdoou sempre todos”. “Esta é mensagem de Jesus, a mensagem do perdão. Tenhamos a religião que tivermos, a cultura que tivermos, a preparação que tivermos, os defeitos que tivermos, somos filhos da mesma criação, da mesma espécie, do mesmo Deus unidos em Jesus Cristo”, realçou, lembrando que mesmo assim Jesus, feito réu e “declarado inocente, foi julgado e morto” mas “deixou sementes para continuarem a sua missão”. “As sementes somos nós. Jesus precisa de nós para esta missão. E qual é a missão? Dizer a todos que Deus é Pai de misericórdia, Pai do perdão”, acrescentou.
Antes da saída do cortejo, o bispo do Algarve que presidiu à procissão exortou a vivê-la com “devoção” e “fé”, “interiorizando tudo aquilo que ela sugere”. “Que a celebração da ressurreição de Cristo traga a cada um de vós alegria e seja fonte de esperança, de perdão, de uma vida feita doação e serviço para os outros”, desejou ainda D. Manuel Quintas.
A Procissão do Enterro do Senhor mais imponente realizada no Algarve percorreu as principais artérias da baixa farense, perfumadas do rosmaninho que lhe serviu de tapete, e voltou a contar com a participação do Coro de Câmara da Sé, sob a direção do maestro Rui Jerónimo, que interpretou alguns trechos de música sacra relativos à morte de Jesus.
O secular préstito procura anualmente reviver, com densidade orante silenciosa, o episódio protagonizado por José de Arimateia. Pilatos, depois da confirmação da morte de Jesus, entregou o corpo de Cristo a este membro do conselho do Sinédrio para que fosse sepultado.
A Procissão do Senhor Morto –, a terceira de maior expressão realizada no Algarve, logo depois da de Nossa Senhora da Piedade (Mãe Soberana) e da das Tochas Floridas em São Brás de Alportel –, sai aberta por uma representação a cavalo da GNR e um friso de tochas. Segue-se a matraca, cujo som áspero, que se ouve ao longe, simboliza as ondas de ódio amontoadas à volta de Cristo. A certa distância vem o guião ladeado por duas lanternas. Alguns metros desviada, a iniciar as alas os balandraus com tochas, a cruz com o lençol pendurado. Entre as alas, o “tumbinho” carregando o corpo de Cristo, debaixo do pálio, e, no meio, seguem os três andores comportando as imagens de Nossa Senhora, o apóstolo João e Maria Madalena, os três que permaneceram junto à cruz.
Participam ainda no préstito, que contou também este ano com o acompanhamento da banda da Sociedade Filarmónica Lacobrigense 1º de Maio, autoridades civis e militares, as Ordens Terceiras de Nossa Senhora do Monte do Carmo e Franciscana Secular, a Irmandade da Misericórdia, os Bombeiros Municipais e Voluntários de Faro, o Moto Clube de Faro, os grupos de jovens católicos da cidade, os agrupamentos do Corpo Nacional de Escutas, os grupos dos Escoteiros de Portugal e a companhia da Associação de Guias de Portugal, entre outras entidades e instituições.